Pensando a Magia com a Física
Em meados da década de 60, Richard Feynman disse “Temos a sorte de viver numa era em que ainda estamos fazendo descobertas. É como a descoberta da América – você só a descobre uma vez. A era em que vivemos é aquela em que estamos descobrindo as leis fundamentais da natureza”. E isso porque naquela época, ninguém sequer sonhava com a Teoria Unificada: hoje, mais do que nunca, a humanidade está próxima a entender a natureza do universo.
Ser capaz de compartilhar a excitação dessas descobertas é a nova representação da magia! Porque nossos personagens vivem em um maravilhoso (e estranho) mundo, mas que é visto com os mesmos olhos com que vemos o nosso: magos deveriam ser os detentores do conhecimento no universo de jogo, mas curiosamente passam a vida sem apreciar a idade, tamanho, violência e beleza decorrentes desse conhecimento.
É como se toda a sabedoria adquirida durante os anos de estudo da magia se resumisse em repetir sempre os mesmos truques – como um cozinheiro que segue sempre o mesmo livro de receitas ou um engenheiro civil que constrói apenas castelos de areia. Claro que para poder ir além disso, o jogador deve ser capaz de empregar uma imaginação extraordinária… mas isso não é de todo verdade, porque a tal imaginação extraordinária não é nada difícil de ser empregada, desde que se fuja da tal interpretação burocrática das regras. É a mesma situação em que nós, seres humanos, nos encontramos: o cosmo, apesar de sua vastidão, é considerado insignificante em nosso cotidiano e tentamos dar um sentido ao que nos cerca sem saber ao certo aonde é que nos encaixamos. Porque interpretamos as regras da nossa existência de maneira burocrática.
Claro que há diferenças e tem sempre a velha desculpa de que nos jogos de RPG os magos tendem a habitar terras antigas e com pouco (ou nenhum) desenvolvimento tecnológico. E assim como os povos antigos (que tentaram com afinco entender o funcionamento da natureza) eles também não desenvolveram nossa matemática e ciência, não possuem essas poderosas ferramentas com as quais nossos cientistas obtém o conhecimento sobre o universo: por isso, podem ignorar totalmente a física…ou não!
Você não precisa ser um PHD em física ou filosofia para conseguir encaixar a física na magia de seu universo de jogo. Basta entender um pouco sobre a natureza do universo em que vivemos e isso é muito mais simples do que parece: tenho certeza de que vocês já ouviram falar em Aristóteles, mas talvez não saibam que ele acreditava que tudo que existia era feito de quatro elementos fundamentais: terra, ar, fogo e água. (Na verdade, essa teoria pertence a um cara chamado Empédocles, mas Aristóteles acreditava mesmo nela). É um princípio suficientemente simples e no qual se baseiam os guias de magia de vários sistemas de regras.
Claro que no decorrer do tempo, os cientistas passaram a descrever o universo em termos mais complicados que os adotados por Aristóteles: atualmente, descrevemos o universo em termos de duas teorias básicas, a teoria da relatividade Geral (lembra dela? Elaborada por Albert Einstein) e a mecânica quântica (sempre citada, nesses artigos e até agora não explicada. Mas vá com calma, que chegaremos lá). São essas as duas grandes conquistas da física do século XX, a relatividade geral descrevendo a força da gravidade e a estrutura em grande escala do nosso universo (coisas com tamanho entre alguns quilômetros até um seguido de 24 zeros quilômetros. É algo muito grande! Na verdade, é aproximadamente o tamanho do nosso universo.). Já a mecânica quântica, por outro lado, lida com fenômenos em escalas extremamente pequenas, como um milionésimo de milionésimo de centímetro.
Devido a diferença de tamanhos trabalhados, você já deve ter imaginado que essas duas teorias não funcionem muito bem juntas. Na verdade, elas não funcionam MESMO juntas, são teoricamente incoerentes entre si, porque não é possível que ambas estejam corretas.
Por isso, um dos maiores empreendimentos da física atual é a busca de uma nova teoria, que incorpore ambas – aquilo que já citei em um artigo anterior, a chamada teoria quântica da gravidade. Embora a ciência ainda esteja muito longe de encontrá-la (o que de certa forma é muito bom, porque após a formatura, eu odiaria sofrer um recall de físicos, que teriam de voltar para a faculdade para aprender tudo de novo!), mas já conhecemos muitas das propriedades que ela deve ter.
É o que nos traz de volta ao RPG: você pode não saber exatamente como a física funciona, mas muitos jogadores já pararam para pensar em como a magia deve funcionar em um universo de jogo. Essas previsões podem ir até um nível bem complicado de explicação, mas como estamos falando de um jogo ( e não da elaboração de uma teoria quântica da gravitação), vamos pegar o modelo de universo favorito do nosso colega Ari (depois de estudar o cara tanto tempo, já temos uma certa intimidade, sabem?) e aplicar alguns conceitos de física clássica (não confunda as teorias do Ari com física clássica apenas pelo nome: a Grécia pode fazer parte da história clássica, mas a física clássica é aquela que vêm antes da física moderna, ou seja, todo o conhecimento adquirido pela humanidade a respeito do universo até 1905). Ou, como diz um amigo meu, vamos instalar o Service Pack Física no sistema operacional dos nossos magos, de acordo com o que pode ser aprendido em uma escola de magia com algum conhecimento de física: nos vemos em 15 dias!
Leia os artigos anteriores do autor:
Física & Magia
- A vida no universo (e tudo o mais)
- Matrix, Vestibular e Papai Noel…
- Com quantas dimensões se faz uma canoa?
Interlúdio
“Física no RPG ”
- Parte I – Superpoderes e o Superconhecimento
- Parte II – Supervelocidade: SuperPoder ou SuperMaldição?
“RPG e Física. Alguma relação?”
- Parte I – O que desenhar mundos imaginários em papel quadriculado tem a ver com Física?
- Parte II – Era Einstein um RPGista?
- Parte III – Deve ser brincadeira: Jogar RPG com Feynman?
- Parte IV – Bandidos e mocinhos: A entropia, Maxwell e seu demônio de estimação
- RPG e Física. Alguma relação? (Textos compilados, editorados e ilustrados)
Por Francisco de Assis Nascimento Júnior
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