REGRAS DO JOGO (Critérios de Avaliação)
O FATO: Qualquer RPG só precisa de regras básicas e antagonistas. Todo suplemento é opcional. Logo, toda avaliação é subjetiva. Todo suplemento se caracteriza pelo seu BÁSICO, é BOM, MAL, FEIO e ESTRANHO em maior ou menor grau.
O BÁSICO: Aqui vão as informações físicas do suplemento.
O BOM: Porque seria legal você ler ou ter este suplemento. Hora de louvá-lo.
O MAL: Porque este suplemento é ruim para você. Hora de criticá-lo.
O FEIO: Porque acho que faltou algo no suplemento. Hora de malhá-lo.
…E O ESTRANHO: Anedotário e esquisitices. Hora de gozá-lo.
E VALE?: Porque eu adquiri o suplemento e se acho que me arrependi.
O BÁSICO
Pathfinder: Horror Adventures (HA)
Pathfinder RPG
John Bennett e outros autores
Paizo publisher
www.paizo.com
Edição 2016, capa dura, 256 páginas, tamanho octavo imperial (22x28cm) miolo e ilustrações coloridos
Disponível fisicamente e .pdf. Preços variados
O BOM
Horror Adventures versa sobre… Tcharam: HORROR! As coisas que assombram e predam durante a noite. O mal ancestral que dorme nos interstícios do multiverso, a degradação e corrupção da mente e corpo mortal, essas coisas.
E o livro cai com as presas no tema e apresenta insanidade, medo, corrupção, feitiços, rituais, arquétipos, talentos e dicas de como mestrar campanhas de horror no heroico mundo do d20. E consegue apresentar coisas muito boas.
Primeiro em sua organização: finalmente sem classes novas! Vai direto para arquétipos e opções, algo mais importante para campanhas de horror do que classes.
Apresenta uma mecânica de corrupção bem interessante, aproveitando monstros clássicos de horror e orquestrando as regras para que o jogador lentamente se transforme em um deles. Muitas idéias de campanha.
Já as regras de sanidade, se não perfeitas, pelo menos não criam mecânicas complicadas. Integram bem a ideia anterior de cada insanidade ser uma doença e apresentam diversas opções. A novidade é criar um valor de sanidade, que a exemplo do Chamado de Cthulhu (CoC) vai sendo corroído com o tempo (não tanto quanto no CoC, é verdade). As regras de medo e pavor são a parte mais fraca desta sessão, bem elaboradas mas engessadas no sistema, diferente, por exemplo, do que se via em Ravenloft (e sim, comparações vão se tornando inevitáveis durante a leitura).
Entremeado por todo livro, como de praxe em suplementos do tema, existem notas dando dicas de interpretação e sugestões de jogo. Bem dimensionadas e sucintas, são muito úteis.
Novamente o brilho do livro fica nas interpretações de regras e na geração de aventuras, e no caso do Horror Adventures, ele o faz com maestria: como resolver situações como ser enterrado vivo, como lidar com assombrações, maldições, pragas. Como montar uma campanha de horror, suas diferenças e, surpresa das surpresas, gêneros de horror (sem frescura e com dicas de aventuras). Apresenta conselhos práticos e fáceis de usar na mesa para criar suspense e terror (como o antigo Ravenloft do AD&D, e sem papagaiadas impraticáveis). Muito bom, bem escrito e bem formatado.
Apresenta poucos monstros, mas bem formatados para o terror. Mais templates que criaturas, podem ser bem aproveitados. Os itens mundanos e mágicos seguem a mesma linha, com equipamentos de tortura e encantos para bonzinhos e malvadinhos. Destaque especial para itens amaldiçoados e possuídos, assim como diversas extrapolações no critério assombrações.
Por fim, magias e talentos. Em livros com este tema são sempre as partes mais procuradas. Ele não decepciona, dando uma boa amostra de ambos tanto para o bem quanto para o mal. O HA consegue equilibrar bem os aspectos do bem e do mal, servindo a ambos com maestria. O que não quer dizer que seja perfeito…
O MAL
Quem sabe o mal que reside no coração dos homens? Bom, nem eu nem o leitor vamos saber, pois o livro não vai muito por este lado. As regras de corrupção (que nasceram dos dark powers de Ravenloft, admitamos) não exploram muito a saia justa do “homem bom fazendo coisas ruins”. No Ravenloft original existia uma tabelinha que mostrava ações diárias comuns e seus resultados frente aos poderes negros. Servia de base para medir o mal prosaico do dia a dia, às vezes mais insidioso que os demônios do inferno. O Book of Vile Darkness e o Heroes of Horror abordavam este assunto (o Vile Darkness mais profundamente), mas o HA não. Indispensável? Não. Mas ausente mesmo assim.
Também não existe nada sobre sacrifícios ou entidades demoníacas (os vilões de sempre). O livro vai mais para o lado do horror cósmico lovecraftiano, ou temas genéricos, deixando os suspeitos de sempre de lado. Faz falta ao menos uma página sobre isto, já que são meio o padrão das histórias de horror, embora seja compreensível que o livro queira dar novos ares para a campanha (o que faz muito bem).
Enfim, o famoso mastodonte do Pathfinder: os arquétipos que geram listas que ocupam páginas e mais páginas. Eu preciso mesmo de uma opção tipo “cultista dos grandes antigos?”. Acho que não.
O FEIO
Qualquer jogador veterano de d20 conhece os suplementos de horror do sistema: Ravenloft (AD&D e aquela coisa estranha do d20), Book of Vile Darkness e Heroes of Horror. Está na cara que muitas sessões do livro foram inspiradas neles. Também está na cara que os mythos de Cthulhu são parte integral do Pathfinder agora: até as magias se parecem!
E aí que vem a pisada na bola: o HA por vezes se intimida e não ousa além de seus predecessores. Nem assume que se inspirou neles, nem extrapola essas edições.
E isto culmina na ausência de qualquer RPG na sessão de bibliografia sugerida (tem uma bibliografia sugerida!). Ela se resume a filmes, séries e livros. Sem RPGs. Nenhum. Sem menção ao Chamado de Cthulhu, Ravenloft, Heroes of Horror, Kult, Shadow of the Demon Lord, etc. Até o GURPS Horror citava RPGs na bibliografia. Feio, muito feio…
…E O ESTRANHO
Saudades de Ravenloft? Talvez a criatura Dread Lord seja familiar, assim como regras de domínios de horror (de onde será que veio essa ideia?).
Existe um box com dicas do que NÃO FAZER em uma sessão de horror (como usar maquiagem). Nessa época de falta de bom senso é gratificante ver um livro que pensou nisto.
Enfim, o HA tem tanta referência aos mythos de Cthulhu que ameaçou broxar o projeto Sandy Petersen’s Cthulhu Mythos for Pathfinder. Tanto é verdade que na página do quickstart tem uma avaliação do livro antes dele sair e o quanto que ele ameaçaria o projeto (diplomático, a conclusão é que são meio diferentes, mas compatíveis). Abaixo, a postagem:
E VALE?
Sim! Vale! Vale mais ainda se você for fã de horror, se tiver o Book of Vile Darkness, o Ravenloft e o Heroes of Horror e, como eu, gosta de torcer a realidade em prol do horror e loucura. O livro é muito bem elaborado, e especialmente para os amantes de Lovecraft, firma as bases do mythos no sistema. Não mais protagonistas obscuros, agora destacam-se como os vilões máximos, com elder sign e tudo.
Uma ressalva: o grande impacto do Horror Adventures pode ser apreciado quando combinado ao Occult Adventures. Se fosse graduar uma aventura do suspense ao horror, pensaria nestes dois suplementos juntos. Em tempos de kopins desvalorizados, considere investir em PDFs dos dois. Dói no coração não ter ambos fisicamente, mas realidade é realidade.
Por Marco Poli de Araújo