– A primeira lição de Akodo.
Dos diários de Shinjo Gaemon, daimyo do Unicórnio:
Por sete semanas os Ikoma viveram entre nós, escutando as histórias das Terras Escaldantes e nos ensinando os modos de combate desta terra estrangeira. Fomos ordenados pelo Imperador a entrar em paz com o Leão após as batalhas sangrentas dos anos recentes. Tem sido uma jornada difícil entrar em harmonia com o clã mais bélico desta nação. Em adição aos nossos esforços, o Imperador Hantei decretou que o daimyo dos Ikoma residisse conosco durante a primavera, retornando para as terras de seu povo após aprender os nossos métodos e compartilhar os deles.
Os Leões são muito parecidos conosco, ainda que seus ideais de “honra” e “propósito” pareçam muito exagerados para se acreditar. Seu daimyo, Ikoma Anakasu, fala regularmente comigo e seus filhos brincam com os meus nos campos ao redor do castelo. Nossos cavalos parecem estranhos a eles, diferentes dos pôneis murchos e mulas que eles usam como montarias de batalha. Esses Leões não são só rápidos em aprender, mas também em aplicar esses conhecimentos para melhorar suas táticas de guerra.
Ontem, quando me sentei com Anakasu para discutir os pontos sensíveis do combate montado, sua esposa aproximou-se de nós, fazendo uma reverência profunda perante seu marido. “Nossa filha,” ela disse calmamente, com sua face tranquila e relaxada, “desapareceu, meu esposo”.
Eu lhe dei algum tempo para responder, enquanto sua atenção permanecia em uma folha passando em um córrego. Quando falou, sua voz era calma como a dela. “Mande os samurais procurarem nos campos, nas pedreiras e no rio.” Seu gesto de dispensa colocou-a sobre seus joelhos, para depois voltar a passos largos pelo caminho de onde havia vindo. Mulheres do Leão. Quando muitas mulheres andam, elas caminham – quando muitas mulheres coram e sorriem, elas são silenciosas e encaram com o olhar mais inquietante possível. Elas se parecem muito com nossas Damas Guerreiras, apesar dos Ikoma raramente as enviarem para a guerra.
A tarde se passou e o sol começou a se por atrás das altas montanhas de nossas terras. A esposa de Anakasu retornou, mas não disse nada. A criança – é o que parecia – não tinha retornado. A noite passou e nenhuma palavra vinha de nossos hóspedes – nenhum pedido de ajuda, nenhum pesar da mãe enlutada, apenas silêncio e os brados do treinamento que já avançava pela noite escura.
Quando o sol se levantou, eu falei com Anakasu enquanto sua esposa nos servia o café-da-manhã. “Deveria mandar meus batedores montados à procura? Eu estou certo de que sua filha está segura em algum lugar – estas terras, e suas trilhas, podem ser confusas. Meus homens podem ser de grande valia para o senhor.”
O daimyo do Leão olhou para mim então, com seu olhar bem controlado. Após uma pausa educada, ele falou: “Sim, isso pode ser apropriado – mas não antes de seus homens completarem o treinamento desta manhã. Cada coisa em seu tempo.”
Enquanto eu olhava para os olhos de sua esposa, eu sabia que, em momento algum, eles haviam me pedido ajuda. Apesar de sua gratidão reluzir em seu olhar moderado, sua filha poderia estar perdida para sempre nas terras rochosas do Unicórnio antes dela ter a chance de pedir ajuda para um estranho. Mesmo após viver conosco por sete semanas, o Leão não permitia a si mesmo admitir nenhuma fraqueza. Talvez a criança tenha morrido, eu não sei. Tudo que sei é que qualquer Leão que eu tenha encontrado antes ou depois faria o mesmo.
Nós procuramos a criança pela manhã, até que os gritos de meus homens declararam que a haviam encontrado. Anakasu e eu disparamos para a clareira para ver o que havia acontecido. Quando chegamos, um dos guardas Shinjo estava ajoelhado ao lado da pequena menina, com sua tanto exposta e sua mão tremendo. Com um corte rápido, ele separou a cabeça de uma víbora negra que a garota estava pisando. Seu pé estava apoiado logo depois da cabeça da serpente, pressionando-a no chão com seu peso diminuto. A esposa de Anakasu ajoelhou-se para a criança cansada e pegou a filha de três anos de idade em seus braços.
“Ela devia estar de pé sobre essa cobra a noite inteira,” disse um dos guardas, colocando o corpo da víbora em um saco. “Se ela tivesse tirado o pé, a cobra a teria mordido antes de conseguir se afastar. Juro pela minha vida que ela estava tranquila quando nós a encontramos.” Ele olhou para mim e para a criança embalada no colo da mãe. “Esta pequena é uma menina corajosa, Lady Ikoma-sama. Todos os seus filhos também o são?”
A esposa de Anakasu permanecia atrás de seu marido, com sua criança quase dormindo em seu colo. “Eu tenho apenas uma filha,” ela disse, enquanto olhava nos olhos de seu marido, e sua voz soou com orgulho. “Mas esta criança… é um Leão.”
À medida que a mulher se afastava, o daimyo Ikoma virou-se para mim e falou com a voz calma e sem emoção. “Esta cobra…” ele apontou para o saco que o bushi carregava, “como seu povo a chama?”
“É conhecida como tsanuri, meu Senhor. A palavra significa ‘morte paciente’.”
Ele assentiu, e juntos nós observamos sua senhora carregar o futuro do Leão de volta ao palácio de meu povo.
Um guerreiro é forjado como a lâmina de sua espada. O campo de batalha é sua bigorna, suas lutas são as marteladas do ferreiro. O espírito do guerreiro é fundido pelo fogo das adversidades e resfriado pela água das emoções. O fio da lâmina é sua perícia, o aço de reforço é sua honra, o kami da espada sua alma. O propósito do guerreiro é o propósito da espada: servir ao seu senhor, defendendo ou atacando, garantindo a paz ou proclamando a guerra, protegendo a vida ou retirando-a.
Nenhum clã tem maior ciência do significado da palavra samurai – servo – do que o Leão. De fato, foi o kami Akodo o primeiro a cunhar essa palavra e aquele que definiu tudo o que ela significa. O bushido, famoso código de conduta do guerreiro, foi criado por Akodo Caolho. Seus princípios e valores são estudados e repetidos incessantemente dentro do clã, como o maior guia que todo samurai honrado – bushi, shugenja ou cortesão – deve seguir para ser digno de portar esse título, de pertencer ao seu clã, do orgulho de seus antepassados e do reconhecimento de seus pares.
Seguir o passo de seus ancestrais, cujas glórias são contadas, registradas e celebradas ano após ano por historiadores, bardos e cortesãos, é seguir seu caminho de vitórias, sabedoria e esforço. É honrar suas lutas e seu caráter. É manter o valor de sua família expresso em seu próprio nome até a sua morte.
Cada Leão é um representante de seus ancestrais. O Leão não age por si, mas para honrar o passado, atender ao presente e proteger o futuro. Sua própria vida não é sua, mas de cada pessoa do Império representada e manifestada pela figura magnânima do Imperador. Isso lhe exige não apenas a correção de suas atitudes, mas a coragem de corresponder ao que todos esperam dele. Ele não é o que quer ser, mas o que precisam que ele seja: um verdadeiro servo – íntegro, leal, compassivo, corajoso, honrado, honesto e cortês. Para isso, seu espírito deve ser forte e resistente como o aço; ele não pode hesitar nem fraquejar.
O preço da integridade é o rigor consigo mesmo.
O Coração do Leão
– Akodo Toturi
Todo homem tem a consciência de que, um dia, irá morrer. O Leão espera que isso aconteça da maneira mais honrada possível: no campo de batalha, a serviço de seu senhor. Um Leão é treinado sabendo que a cada dia a morte está a um metro – o tamanho de uma espada – de distância. Isso os faz abraçar a morte como sua companheira, quase uma amante, durante toda a vida. Um dia os amantes irão se encontrar e esse dia deve ser glorioso.
Obviamente, isso não os faz suicidas em potencial, pelo contrário; a consciência da brevidade da vida os permite enfrentar as situações mais perigosas com coragem e convicção. Quando se sabe que a vida pode acabar a qualquer momento, há apenas o presente para se deixar um legado de glória. Já que a vida é curta, a memória de seus feitos e de seu nome é a única eternidade que um homem pode almejar para si.
Entregar-se à morte de maneira displicente, apenas buscando a fama de um fim glorioso, é uma atitude egoísta que desvia o samurai de seu verdadeiro objetivo: servir. A morte é o último ato de servidão que um samurai pode realizar, por que deveria ser o primeiro? Há muito a se fazer antes de sucumbir, morrer sem propósito é tornar-se inútil. Um bom samurai precisa alcançar o equilíbrio entre lançar-se nos braços da morte e hesitar perante o perigo. A ação e o pensamento devem ser um; uma ação sem pensamento é imprudência, um pensamento sem ação é covardia.
Pensar como um guerreiro faz o Leão enfrentar todas as situações da vida como se estivesse em um campo de batalha. Só há duas opções possíveis: avançar para vencer ou retroceder para reunir forças. Cada ato realizado, cada palavra dita segue uma dessas duas opções. Isso pode gerar conflitos, é claro, mas os Leões não são conhecidos por evitarem conflitos. O conflito é a oportunidade que um samurai possui para ganhar glória, para ser visto por seus pares e, principalmente, pelos seus ancestrais. O combate físico é apenas a forma mais óbvia de resolver um conflito e não necessariamente a mais eficiente.
Akodo e o Bushido
– Togashi
Quando Akodo enfrentou Hantei no torneio para a escolha do Imperador, por pouco não se descontrolou e matou o próprio irmão. Foi apenas quando Hantei lhe mostrou o reflexo do sol na lâmina de sua espada que Akodo lembrou-se da mãe e da relação de parentesco entre os dois, poupando a vida do irmão. Neste momento, Hantei derrubou Akodo e se consagrou campeão do torneio e Imperador de Rokugan.
Akodo percebeu que a luta sem propósito não poderia ser a conduta de um guerreiro honrado e que a ira desmedida por pouco custou a vida de seu irmão e Imperador. Apoiado em seus joelhos, Akodo jurou fidelidade absoluta a Hantei e que ele e seus descendentes o defenderiam até o último Akodo.
Akodo saiu pelo Império em busca de homens que pudessem defender seu irmão. Ao reunir seu primeiro grupo, todos desconfiaram dele. Ninguém jamais havia ouvido falar de algo como uma guerra, por isso era impensável que um bando de homens poderia agir em conjunto como um exército. Alguns até suspeitaram que Akodo pudesse estar reunindo uma horda para usurpar o trono.
Foi Shinjo que falou por ele quando os sussurros tornaram-se discursos. “Akodo não está praticando a Arte da Guerra,” disse ela, “mas defendendo a Arte da Paz.”
Estes dizeres encontram-se até hoje gravados nas paredes do Palácio Akodo.
Para determinar a conduta de um verdadeiro guerreiro, Akodo redigiu o bushido, literalmente o Caminho do Guerreiro, e ensinou-o a todos os seus bushi. Em princípio, o bushido se aplicava apenas aos homens de armas, mas hoje se discute sua extensão também para os shugenja e cortesãos.
Sobre os princípios básicos do bushido, Akodo escreveu o seguinte:
Jin (Compaixão): Através de intenso treinamento, o samurai torna-se rápido e forte. Ele não é como os outros homens. Ele desenvolve um poder que deve ser usado para o bem de todos. Ele tem compaixão. Ele ajuda os seus subordinados em todas as oportunidades. Se uma oportunidade não surgir, ele persegue uma.
Yu (Coragem): Erga-se sobre as massas de pessoas que têm medo de agir. Um samurai precisa ter coragem genuína. Isso é absolutamente arriscado. É perigoso. É viver a vida completamente, plenamente, maravilhosamente. A coragem heroica não é cega. É inteligente e forte. Substitua o medo por respeito e precaução.
Rei (Cortesia): O samurai não tem motivos para ser cruel. Ele não precisa provar sua força. Um samurai é cortês, mesmo com seus inimigos. Sem essa demonstração de respeito, não somos mais do que animais. Um samurai não é apenas respeitado pela sua força em batalha, mas também pelo modo como lida com os outros homens. A verdadeira força interior do samurai torna-se aparente nos momentos difíceis.
Chugo (Dever e Lealdade): Para um samurai, fazer alguma coisa e dizer alguma coisa torna-o dono dessa coisa. Ele é responsável por ela e pelas suas consequências. Àquilo que ele é responsável, ele se mantém inteiramente leal.
Gi (Honestidade e Justiça): Seja cuidadosamente honesto ao lidar com todas as pessoas. Acredite na Justiça, não vinda dos outros, mas de si mesmo. Para um verdadeiro samurai, não há tons de cinza em questões de verdade e justiça. Há apenas o certo e o errado.
Meyo (Honra): Um verdadeiro samurai possui apenas um juiz para a sua honra, e é ele mesmo. As decisões que você toma e como essas decisões são executadas são um reflexo de quem você verdadeiramente é. Você não pode esconder-se de si mesmo.
Makoto (Sinceridade): Quando um samurai diz que irá realizar uma ação, é como se ele já o tivesse feito. Nada o impedirá de completar o que ele disse que vai fazer. Ele não precisa ‘dar sua palavra’. Ele não precisa ‘prometer’. O ato de simplesmente dizer determinou o ato de fazer em seguida. Dizer e fazer são a mesma ação.
Matsu, a Noiva de Ninguém
– da peça de Kakita Morushijin, Noiva de Ninguém
Matsu era uma mulher alta, com espírito de aço, que vivia sozinha numa vila próxima à cidade que se tornaria Otosan Uchi. Seus estudantes eram guerreiros tão valorosos e bem treinados que sua reputação era conhecida por toda a cidade, sendo superada apenas pela reputação da própria sensei. Quando Akodo chegou à vila para buscar homens para seu exército, Matsu mandou seus estudantes praticarem katas durante todo o dia, ignorando o chamado de Akodo. Ela desprezava o kami e os homens que havia reunido, e não tardou muito para o desdém de Matsu chegar aos ouvidos do general.
Akodo retornou a vila e tentou cortejá-la. Ela tomou isso como um insulto e desafiou-o a vencê-la em campo de batalha. O ganhador lideraria o exército formado e o perdedor o serviria. Akodo aceitou o desafio, mas adicionou uma condição: se ele a vencesse em combate, ela seria sua esposa. Matsu respondeu a essa condição com outra: se ela vencesse, ele nunca mais poderia pedi-la em casamento. O combate se encerrou com o fio da lâmina de Akodo encostado no pescoço de Lady Matsu.
Matsu uniu-se ao exército de Akodo, mas eles nunca se casaram. O kami ainda insistiu por diversas vezes, sempre recusado pela orgulhosa guerreira. É dito que ela escolheu como marido o quarto homem do exército de Akodo, um homem cujo nome se perdeu no tempo. Na peça de Kakita Morushijin, quando Akodo pergunta a Matsu, no dia de seu casamento, por que escolheu um de seus homens ao invés dele, ela responde: “Se eu escolhesse você, eu seria a noiva de Akodo. Ao me casar com ele, ele será o marido de Matsu.”
As Matsu são a maior e mais orgulhosa família do Império. De fato, a maior parte da conhecida beligerância do Clã do Leão se deve às Matsu: seu exército é o mais numeroso de Rokugan e o mais constantemente mantido em atividade. No clã mais bélico do Império, as Matsu são suas guerreiras mais temíveis. Suas técnicas se baseiam principalmente em minar a moral inimiga com ataques diretos e furiosos.
A conjugação no feminino é proposital: os maiores nomes da família são mulheres. As mais habilidosas fazem parte do chamado Orgulho do Leão, a tropa de elite das Matsu. O Orgulho existe desde a primeira guarda pessoal de Lady Matsu, um grupo de ronin mulheres que a própria Matsu treinava e mantinha em sua maior confiança.
Apenas mulheres podem fazer parte do Orgulho, homens são considerados por elas muito “irritantes” e “antissociais”. Seu treinamento é pesado e requer um grande conhecimento de tática e estratégia; elas lutam juntas, comem juntas e vivem juntas. Mesmo o daimyo da família Matsu, ao assumir o seu posto, precisa passar seis meses com o Orgulho para poder mostrar sua força e ser aceito pela tropa como um líder capaz. Isso ocorre mesmo nos (poucos) casos em que o daimyo das Matsu é um homem.
– Matsu Ketsui, do Orgulho do Leão
A família segue ainda a tradição de sua gloriosa ancestral: todos que se casam com uma Matsu precisam abandonar o nome da família original e assumir o nome Matsu, mesmo se o noivo for de um status mais alto. Apesar de muitos fora da família se sentirem insultados pela arrogância dessa tradição de família, os Leões explicam que isso se deve a algo iniciado pela própria Lady Matsu em seu casamento. É claro que isso é dito pelas outras famílias, pois as próprias Matsu não se importam em dar satisfação nenhuma dos seus hábitos para os de fora.
A Astúcia de Ikoma
– Ikoma.
Akodo juntou seu exército entre diversos homens e mulheres em variados locais do Império. Nos arredores do palácio, obteve seus primeiros samurais. Na pequena vila próxima a Otosan Uchi, deparou-se com Lady Matsu e seu Orgulho. Mas foi justamente em uma casa de saquê, um local frequentado por bêbados e bandidos, que o irrepreensível Akodo encontrou um dos seus mais leais e sábios homens.
Indicado por um garoto que encontrou na rua, Akodo dirigiu-se a uma casa de saquê onde recebeu a indicação de haver um guerreiro muito famoso. Ao entrar, homens se ajoelharam e lhe prestaram reverência, enquanto temerosamente um jovem lhe pedia a daisho. “Não tema as espadas,” disse Akodo enquanto as entregava ao rapaz, “mas o homem que as empunha.”
“Estou à procura de samurai.” Akodo dirigiu seu desafio em alto e bom som a todos no estabelecimento. “Homens para ficarem ao meu lado. Quem aqui gostaria de colocar sua habilidade à prova?”
Acostumado ao silêncio que se seguia a cada vez que fazia essa pergunta, o kami se surpreendeu ao ouvir uma sonora risada vinda do fundo do estabelecimento. Um corredor de pessoas se abriu até ver que a origem da risada era um homem velho que se sentava em um canto, displicentemente ante a presença do orgulhoso kami. Sentindo a fúria acumular-se em sua barriga, Akodo questionou o velho: “Por que está rindo…”
“Você é muito engraçado,” disse o velho.
“Quem é você, ancião?”
O velho sorriu, revelando um dente quebrado e uma língua meio cortada. “Eu? Eu sou alguém de pouca importância. Pelo menos à sombra de um grande senhor como você.”
O tom de sarcasmo atingiu os ouvidos do kami como uma faísca que atinge um óleo inflamável e apenas a disciplina do general pode impedir que o fogo de suas entranhas se tornasse um incêndio.
“Você não sabe qual é o seu lugar, velho tolo?”
“Obviamente você não sabe qual é o seu… garoto.”
A fúria de Akodo chegou ao seu limite. Ele empurrou a mesa que se colocava entre eles e apontou para o ancião, desafiando-o: “Eu sou Akodo, filho de Amaterasu…”
“Eu sei quem você é,” disse o ancião impacientemente. “Mas você não sabe quem eu sou. E quão sábio é desafiar um homem de quem você não sabe nem o nome?”
Essas palavras sustentaram a raiva de Akodo apenas por um pequeno instante. “Muito bem,” disse o kami, “diga-me quem você é.”
O ancião sorriu. “Eu sou Ikoma. Sou o homem mais forte do mundo, pois nenhum até agora conseguiu me derrotar.”
“Uma reivindicação emocionada,” disse Akodo.
“Mas verdadeira. Você vê isso?” ele disse enquanto apontava uma profunda cicatriz no rosto. “Essa cicatriz foi feita pela garra de um Ogro. Ele era forte, mas eu sou mais forte. Eu quebrei seus dedos… um por um. E aqueles que eu não pude esmagar, eu mordi.”
“E esta aqui,” disse apontando para um rasgo na parte de baixo de seu braço, “eu ganhei quando descobri que uma gueixa com quem dormia era na verdade uma bruxa.” Ikoma aumentou o tom quando viu que todos no local olhavam para ele. “Mas ela fugiu gritando quando terminei com ela.”
Akodo, vendo os homens assentirem e as mulheres corarem, soube que o ancião estava dizendo a verdade.
Então Ikoma apontou para seu olho totalmente branco. “E esse olho eu perdi para um homem que dizia ter treinado com o próprio Kakita.” Ikoma tirou um mon da Garça de seu obi. “Parece que ele não treinou o bastante.”
“Você teve sorte,” disse Akodo, muito mais calmo.
“Que nada!” disse o velho. “As Fortunas queriam a minha garganta o tempo todo.” Então olhou fundo nos olhos de Akodo e disse: “Mas eu as venci também.”
E, para cada cicatriz que mostrava em seu corpo, Ikoma contava uma nova história. De repente Akodo percebeu que estava sentado ao lado do ancião ouvindo suas histórias com um sorriso no rosto.
Finalmente, Ikoma terminou com suas cicatrizes e disse: “Eu sou Ikoma, e é por isso que eu sou o homem mais forte do mundo. Se quiser lutar contra mim agora, eu vou lutar contra você. Mas saiba de uma coisa, Filho do Céu: você pode até vencer essa luta – pois todo homem encontra alguém melhor que ele, cedo ou tarde – mas você não vai simplesmente sair andando normalmente depois. Você vai ficar sem um olho, vai perder um dedo ou dois, mas, se tiver sorte, pode ficar com todos os seus dentes. Então, se estiver pronto, podemos ir pra rua agora resolver isso. Só eu e você. Sem espadas ou facas. Somente punhos e dedos, e unhas e dentes, e vamos arrancar os pedaços um do outro até que um de nós comece a gritar o nome da própria mãe.”
Ikoma parou e se levantou na direção do kami.
“E saiba disso, Filho do Céu: eu não sei o nome da minha mãe.”
Ambos se encararam por um tempo que parecia durar uma eternidade, até que Akodo disse finalmente: “Você é, sem dúvida, o homem mais forte do mundo. Eu não desejo lutar com você.”
“Pelo menos,” Akodo encerrou, “não agora.”
O Ikoma original era um homem muito peculiar. Um guerreiro, é verdade, mas do tipo encontrado numa briga em uma casa de saquê ou numa luta de facas em um beco escuro, não em um campo de batalha com uma katana nas mãos.
Os Ikoma são práticos acima de tudo. Eles estão acostumados a cumprir qualquer tarefa que o Clã do Leão dê a eles, normalmente uma tarefa que as outras famílias se recusariam. Dada a natureza exclusivamente marcial dos Akodo e dos Matsu e a extremamente conservadora dos Kitsu, não é de se surpreender que os Ikoma sejam conhecidos como a voz do Leão nas cortes. Da mesma forma, eles são também os historiadores e mesmo os filósofos do Clã e, durante as décadas em que a Família Akodo foi dissolvida, foram os Ikoma que interviram e supervisionaram as tarefas que os Akodo tradicionalmente realizavam.
Se alguém examinar os maiores contadores de história de todas as gerações de Rokugan, o padrão que surge indica claramente que os Ikoma dominam esse aspecto dos círculos sociais do Império. Diferentemente de outros cortesãos que se focam em manipulações e indícios de engano, os bardos Ikoma ou omoidasu buscam viver pelo exemplo, citando precedentes históricos e contos míticos de heróis de forma a conduzir qualquer discussão em que eles estejam envolvidos para a direção desejada. Apesar de parecer uma tática curiosa, existem muitos cortesãos no Império que têm dificuldade de se colocar de forma contrária aos Ikoma quando eles demonstram que os ancestrais do indivíduo certamente desaprovariam a sua conduta. Em uma sociedade tão baseada na história e na tradição, o argumento na forma de parábola é uma técnica surpreendentemente efetiva.
Mais do que contadores de história, os omoidasu são o verdadeiro coração do Leão. Isso deve ser entendido da seguinte forma: quando um nobre samurai do Leão está impedido de demonstrar seus sentimentos para não perder a compostura ante a sociedade rokugani, um omodaisu faz isso por ele. Em funerais de homens importantes, enquanto os verdadeiros parentes e amigos do falecido mantém sob controle suas emoções como samurais honrados, um omoidasu é chamado para demonstrar essas emoções ante aos presentes em choros, gritos, insultos e gestos. Ao final, o omoidasu volta ao seu estado normal e agradece pela oportunidade. O omoidasu desaba em atitudes não virtuosas sem perder sua virtude, em nome daqueles que não podem fazê-lo na frente de todos.
O Legado dos Kitsu
– Kitsu Sosenkiu
Mais de mil anos atrás, antes mesmo da raça humana ser criada, grandes criaturas inteligentes já caminhavam sobre a terra, criaturas que se pareciam com animais. Não os Nezumi e suas diversas tribos, que já tiveram sua glória e hoje vivem de forma miserável. Não os Naga e sua incrível capacidade de pensarem em conjunto como uma única mente coletiva. Mas uma raça mais antiga do que essas, uma raça que nasceu antes do mundo: os kitsu.
Há uma cosmogonia muito mais antiga que a rokugani que afirma que cinco raças poderosas criaram o mundo. Os elementos seriam, segundo essa cosmogonia, materializações da magia de cada uma dessas cinco raças. Os kitsu seriam uma dessas raças, a responsável pelo elemento do Vazio. Sua aparência seria a de grandes leões humanoides, assustadores, mas incrivelmente sábios.
Quando o Kami Negro desceu sobre a terra, os kitsu viram as aberrações que saíram do seu fosso medonho e resolveram não se meter, rumando para o alto das montanhas onde habitaria o Clã do Dragão. Sem reconhecê-los como raças inteligentes, as antigas tribos dos homens os temeram e lutaram contra eles. A nobre raça tomou tal atitude como um insulto e reagiu, matando diversos humanos que vivam nas montanhas.
Ordenado por Hantei, Akodo e seus homens foram enfrentar o que parecia ser uma nova ameaça ao Império. Os kitsu foram caçados em seus esconderijos nas montanhas e massacrados antes de poderem se explicar. Ao fim, apenas uns poucos sobreviventes foram encurralados em um vale estreito, prontos para dar suas vidas para defender o seu líder. Quando os humanos os encontraram, o próprio Akodo se lançou na vanguarda e cercou o líder entre as pedras e o abismo em uma verdadeira arena de combate. O líder kitsu, usando de astúcia, conseguiu colocar Akodo na beirada do abismo e emitiu um poderoso rugido, fazendo a terra ceder abaixo do grande kami e ele perder o equilíbrio. Akodo achou que a criatura aproveitaria o momento e o atacaria, arrancando sua cabeça de uma vez com suas garras poderosas, mas ela não o fez. Ela simplesmente encarou Akodo com seus grandes olhos de pupilas verticais e esperou que o homem se levantasse novamente.
“Esperem!” disse Akodo aos seus homens, antes que eles atacassem. Akodo encarou a criatura por um tempo e então, surpreendentemente, a cumprimentou. O kitsu olhou Akodo com incredulidade e estranheza, mas o primeiro passo para uma aliança entre as duas raças havia sido dado. Aos poucos, homens e kitsu começaram a travar uma forma de comunicação e, em pouco tempo, os kitsu que sobravam já arranhavam algumas palavras em rokugani. Arrependido da chacina que havia promovido, Akodo comprometeu-se a cuidar da estranha raça até que os kitsu pudessem voltar a ter um número suficiente para se cuidarem sozinhos.
Estranhamente, isso não aconteceu. Por algum motivo desconhecido, não nasceram mais novos kitsu. A cada vez que Akodo retornava às montanhas, via seu número se reduzir aos poucos. Na última vez em que retornou ao Império, trouxe cinco indivíduos de singular beleza: humanos, mas com uma estranha coloração dourada nos cabelos, incomum em Rokugan. Akodo disse que se tratavam dos últimos kitsu, transformados em humanos pela piedade de Amaterasu. Os cinco juraram lealdade a Akodo e tomaram suas filhas como esposas. Destes cinco descende a família Kitsu, a família de shugenja do Leão.
Alguns descendentes dos cinco kitsu originais apresentaram estranhas habilidades de comunicação com os espíritos. Após séculos de desenvolvimento e aperfeiçoamento, a linhagem principal dos Kitsu conquistou a capacidade de ver, ouvir, falar e até ir aos seus ancestrais, mantendo um contato entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos. Estes indivíduos especiais são chamados de sodan senzo. Alguns sodan senzo mais dedicados assumem para si inclusive a missão de guiar as almas perdidas para o Mei Do, o limbo onde elas aguardam até retornarem à roda reencarnatória.
A Família Kitsu tem por distinção ser a família mais tradicional do clã mais tradicional do Império. Sua filosofia acerca de qualquer tópico em particular é a mesma de dez anos atrás, 100 anos atrás ou mesmo 1000 anos atrás. Eles abordam qualquer desenvolvimento primeiro examinando a história em busca de situações similares. Salvo esses casos, eles tipicamente mantêm-se firmes no seu conhecimento do que é tradicionalmente apropriado e como reagir a cada situação. O bushido e os princípios universais da Ordem Celestial estudados por todos os shugenja são os guias que eles utilizam para tomar essas decisões.
Alguns rituais de família se mantêm quase exatamente os mesmos, com mínimas modificações em séculos de existência. De fato, os Kitsu não apenas prezam a memória dos seus ancestrais, eles a cultuam, pois muitos acham que assim os ancestrais estarão mais satisfeitos. Uma família que é conhecida por ser a ponte entre os vivos e os mortos têm ciência de que a morte é apenas uma passagem; por isso os Kitsu não a temem, mas temem àqueles que já cruzaram a ponte em arco e os aguardam do outro lado.
Glórias do Leão: Ancestrais Célebres
Toturi nasceu como Akodo Toturi, filho de Matsu Daio, irmão do Campeão do Leão, e Matsu Sodohime. O nome Matsu de seu pai e o seu nome Akodo e de seu irmão foram fruto de uma negociação entre as duas famílias para o casamento entre Akodo Daio e Matsu Sodohime; o pai abriria mão de seu nome de família em favor das Matsu para obedecer à tradição dessa família, mas todos os filhos homens levariam o nome Akodo.
Mesmo sendo o primeiro filho de Daio e futuro herdeiro do clã, Akodo Toturi tardou a assumir a liderança do clã mais beligerante do Império, pois na infância não conseguia manejar direito uma espada. Sua mãe o havia rejeitado ao nascer, pois esperava que seu primeiro filho fosse uma mulher, enquanto seu pai viu-o como um verdadeiro fracasso como um samurai e deu preferência a Akodo Arasou, seu filho mais novo, mas muito mais inclinado às ações militares. Desistindo de treiná-lo em Shiro Sano Ken Hayai, o dojo dos Akodo, Daio enviou seu primogênito e herdeiro de sua casa para um mosteiro nas montanhas ao norte de Rokugan. Lá, Toturi dedicou-se ao estudo do Tao e das estratégias militares, tornando-se um grande erudito na Arte da Guerra.
Em um templo próximo ao Santuário dos Ki-Rin, nas terras do Dragão, o jovem Toturi encontrou-se com seu célebre mentor, Akodo Kage, que dizia estar se recolhendo ao templo para meditar sobre a morte de sua esposa. Mestre e discípulo se reconheceram imediatamente e Kage enxergou em Toturi o potencial para ser muito mais do que o que esperavam dele. Como era um renomado sensei de Shiro Sano, Kage treinou Toturi por dez anos, até que o viu pronto para voltar ao Leão e assumir seu direito como futuro daimyo. Entretanto, o resoluto tio de Toturi já havia entregado a sucessão do clã a Arasou, que considerava muito mais competente, mesmo sob os protestos de Kage.
Toturi continuou no mosteiro até duas tragédias praticamente seguidas o forçarem a voltar: a morte de seu irmão em batalha numa tentativa de reconquista da cidade de Toshi Ranbo das mãos da Garça e a morte do Campeão do Clã. Jovem, desacreditado pelos seus pares e ainda despreparado para assumir esse cargo tão subitamente, Toturi sentou-se no trono do Leão, recebendo uma hostilidade às vezes direta de alguns dos samurais mais proeminentes de seu clã, especialmente Matsu Tsuko, a daimyo das Matsu.
A liderança de Toturi foi atribulada, mas aos poucos ele conseguiu introduzir seus métodos pouco ortodoxos no clã das tradições. Toturi estabeleceu alianças com alguns clãs como os rejeitados Unicórnios ou mesmo os odiados Garças, aprendendo com eles novas maneiras de realizar a Arte da Guerra. Tais mudanças incomodaram os mais conservadores e a rejeição de Toturi foi se tornando mais crítica, até o golpe do Escorpião estourar em 1123. Os clãs se uniram contra o usurpador Shoju e conseguiram recuperar o Trono Esmeralda, mas como todos acreditavam que o filho de Hantei tivesse morrido, o próprio Toturi assumiu o trono para impedir que os clãs lutassem entre si por ele. Entretanto, o herdeiro ainda estava vivo e, ao tornar-se o novo Imperador, ele entendeu o golpe como uma falha dos Akodo e a ação de Toturi ao sentar-se no trono como traição. A família Akodo foi oficialmente extinta e o seu Campeão, Akodo Toturi, foi rebaixado à posição de ronin.
Como um andarilho nas terras do Império, Toturi reuniu um bando de ronin, ashigaru e shugenja ao seu serviço, criando o chamado Exército de Toturi. Enquanto isso, no palácio, o Kami Negro assumia o controle do Imperador enfraquecido pelo veneno de Kachiko até as forças das Trevas cercarem Otosan Uchi e reclamarem o Império para o domínio de Fu Leng. O Ronin Encapuzado, figura misteriosa que se mostrou, na verdade, ser um descendente do antigo Shinsei, reuniu os novos Trovões ao seu comando e, entre eles, o ronin Toturi. Quando os Trovões invadiram o palácio e conseguiram distrair o Kami Negro encarnado, Doji Hoturi acertou-o no coração e Toturi pode finalmente cortar sua cabeça. De daimyo a ronin, agora Toturi foi o Campeão do Império, sendo coroado finalmente Imperador Toturi I em 1129.
Seu reinado durou pouco, pois em 1130 Toturi I desapareceu sem deixar vestígios. O clã do Escorpião foi considerado responsável e teve que se exilar nas Areias Escaldantes, enquanto o novo Campeão Esmeralda, Kakita Toshimoko, disfarçou-se de ronin para encontrar o paradeiro do Imperador. Em 1132, Toturi foi encontrado perto das ruínas do Castelo de Mori Kage, cercado pelas forças de Goju. Ele havia caído nas mãos da Escuridão Enganosa e, depois disso, nunca mais foi o mesmo.
Cada vez mais insano e sanguinário, o Imperador Toturi foi sendo consumido pela loucura da Escuridão Enganosa até ser ferido mortalmente por Sanzo, um ronin disposto a vingar sua família, com a espada Ambição, a mesma usada por Shoju para usurpar o trono. Toturi ficou aos cuidados de sua esposa, Kaede, no Palácio Isawa, mas seu ferimento não curava. Em 1133, Matsu Hiroru, antigo servo do kolat, e Ryoshun, o décimo kami, encontraram-se com Toturi no Palácio Isawa e lhe ensinaram uma forma de resistir à Escuridão Enganosa. Toturi teve então um momento de lucidez, em que percebeu o perigo de tal força controlando a mente do Imperador. Para salvar o Império, com Hiroru como seu segundo, Toturi cometeu seppuku.
Akodo Kaneka é o filho ilegítimo de Toturi com a gueixa Hatsuko. A gueixa havia sido mandada por Bayushi Kachiko na tentativa de assassinar Toturi antes da eclosão do Golpe do Escorpião, mas ela acabou se comovendo com a nobreza de Toturi e foi perseguida por sua mestra até se jogar nas Cascatas da Tristeza, próximas a Otosan Uchi. Todos pensavam que a gueixa havia morrido, inclusive a própria Mãe dos Escorpiões, mas ela foi secretamente resgatada pelo Dragão da Água que a manteve em estase, com Kaneka ainda crescendo em sua barriga até o Império estar preparado para o seu surgimento.Kaneka foi criado em uma pequena cabana escondida na floresta Shinomen. Sua mãe nunca lhe revelou quem era seu pai e ele acabou crescendo e viajando pelo Império como um ronin. Em 1154, ao retornar à cabana onde havia crescido, encontra o Dragão da Água que finalmente lhe revela quem realmente ele era.
Em 1155, Kaneka se revela na cidade de Ryoko Owari como filho bastardo do Imperador Toturi I e uma gueixa. Isto causou muita perturbação ao Império, pois Kaneka havia sido concebido antes dos filhos de Toturi com Kaede, o que o fazia o filho mais velho. Por ter puxado o carisma de seu pai, Kaneka havia reunido diversos bushi leais a ele, entre eles alguns Akodo que confirmavam sua origem. Entretanto, Toturi nunca pode considerá-lo seu verdadeiro herdeiro.
Após o funeral do Imperador, a Imperatriz Kaede assumiu o trono de Rokugan por apenas dois anos. Entendendo que suas obrigações como Oráculo do Vazio suplantavam as responsabilidades do trono, Kaede reuniu os quatro filhos de Toturi, incluindo o bastardo Kaneka, e disse-lhes que a eles caberia a decisão da sucessão ao trono. Kaede deixou-os e sumiu no Vazio. Esses quatro descendentes tornaram-se os Quatro Ventos e sua luta pelo trono dividiu o Império. O Campeão do Louva-a-Deus, Yoritomo Kitao, e o Campeão do Unicórnio, Moto Chagatai, reconheceram Kaneka como o legítimo sucessor de Toturi I.
Em 1159, após uma tentativa de seu irmão Naseru de convencer o Império de que Kaneka era na verdade da linhagem dos Yasuki, Kaneka tomou como objetivo mostrar ao Império que era filho de Toturi a todo custo. Conseguiu reunir para sua causa Akodo Ijiasu, Moto Chagatai, Hida Hitoshi, Kitsuki Remata e a filha de Yoritomo, Kumiko, assumindo para si o título de Xógum do Império. Em Kyuden Seppun, a filha de Toturi Tsudao proclama a si mesma Imperatriz Toturi II, levando a cada um dos Quatro Ventos se voltarem um contra o outro. Inicia-se uma guerra civil em Rokugan.
Seu irmão Naseru envia três assassinos do Escorpião para matar Kaneka, que acabam sendo mortos por sua lâmina. Em represália, Kaneka parte com suas forças para Ryoko Owari e cerca Naseru. Ao encurralar o irmão, Kaneka percebe que tudo era um plano para desacreditá-lo como um ambicioso que apenas almejava o trono, e Kaneka baixa sua espada e decide poupá-lo. Ele e seu irmão manipulador fazem então um acordo, de modo a que Naseru assumisse o trono como seu Imperador, mas Kaneka fosse reconhecido como filho de Toturi e assumisse o posto de Xógum sob o comando de seu irmão.
Com o aumento das forças de Daigotsu na Cidade dos Perdidos, Kaede assume que é hora de retornar ao mundo material e reúne os Quatro Ventos para irem às Terras Sombrias derrotar seu novo senhor. Sezaru, o segundo filho de Kaede, entrega a cada um uma Lágrima de Doji, que os permite andar nas Terras Sombrias sem serem maculados. Os Quatro Ventos partem para a Cidade dos Perdidos e enfrentam os Onisu, os horrores de Daigotsu. Tsudao se sacrifica, mas consegue derrotar o Lorde Negro. Naseru é proclamado Imperador e assume o nome de Toturi III. Kaneka assume oficialmente o posto de Campeão do Leão e Xógum.
Entretanto, o governo de Toturi III não é reconhecido pelo khan do Unicórnio, Moto Chagatai. Chagatai reúne suas enormes forças e invade a nova capital, Toshi Ranbo. Seu objetivo é derrubar Naseru e colocar não a si, mas o próprio Kaneka no trono, a quem Chagatai considera o único capaz de governar Rokugan. Quando Chagatai consegue dominar Toshi Ranbo e oferece o trono a Kaneka, ele recusa e os dois começam a lutar. Kaneka consegue infligir um grave ferimento a Chagatai, mas morre sob sua lâmina.