CthulhuTech RPG (resenha)

Estamos no fim do século XXI. A Humanidade não vai ver o início do século XXII.

Foi um século de avanços inimagináveis. A magia renasceu, e se mesclou à tecnologia como dois simbiontes amorosos, solucionando a crise energética do século anterior e trazendo crescimento sem paralelo na história humana. Pobreza, fome e doença ficaram para trás. Nosso pequenino mundo se tornou um lar de onde poderíamos partir e conquistar as estrelas.

Partimos. Estabelecemos colônias em luas próximas.

Nos limites de nosso sistema solar, nossas atividades foram percebidas. E nosso lugar no universo, tão certo, passou a ser questionado.

A guerra veio. Nossos filhos ignotos atacaram, sem saber quem eram, e ao descobrirem, uniram-se a nós.

Seus pais não gostaram disso. E vieram, eles mesmos, pôr-nos em nosso lugar: no laboratório de cobaias.

Uma nova guerra chegou. Quando tudo parecia perdido, deuses despertaram, e cultos antigos voltaram à ativa.

A esperança do futuro, hoje, é apenas propaganda.
 

Bem vindo ao mundo de CthulhuTech.
 

CthulhuTech é um RPG de 2007 que mescla horror, ficção científica e anime em uma combinação elegante e original. Por mais que certos puristas possam não gostar por mera associação, a questão é que o jogo funciona bem naquilo que se propõe, e por mais que se grite no contrário, não perde em terror e desesperança para seu jogo mãe, o consagrado Chamado de Cthulhu.

O CENÁRIO

No cenário deste jogo, estamos em uma Terra muito mais avançada, onde a Humanidade se tornou (ou pode vir a se tornar) uma potência cósmica, como as criaturas dos Mythos que jogadores de Chamado de Cthulhu conhecem tão bem. O advento da Arcanotecnologia (uma mescla inédita de magia e tecnologia), nos permitiu isso, oferecendo energia infinita e potencial tecnológico ilimitado, unificando nações e quebrando paradigmas sócio econômicos.

Isso, é claro, só passaria desapercebido se estivéssemos sozinhos no mundo. Diversas raças, no entanto, já existiam na Terra antes de nós, e algumas delas permaneceram aqui. Uma em particular, os Mi-Go, foram por um tempo os senhores da Terra, mas preferiram se concentrar em sua colônia em Plutão. Para eles, nosso mundo era uma mina de matérias primas, e nós, cobaias para experimentação. Ao nos ver conquistando tanto nosso mundo como a tecnologia de ir além, eles fizeram o que provavelmente nós mesmos faríamos com nossos ratos de laboratório, caso eles se tornassem, de súbito, ativos tecnologicamente:

Um ataque preventivo.Cthulhu-Tech capa

Criando um exército de clones nossos, uma raça biologicamente similar chamada Nazzadi, eles iniciaram uma guerra que diminuiu todas as guerras anteriores, e nos forçaram a nos tornar uma nação global, dedicada a evoluir e sobreviver. Os Nazzadi, descobrindo que eram mais similares a nós do que a seus mestres alienígenas, eventualmente os traíram e se juntaram a nós, possibilitando nosso salto evolutivo ir ainda mais longe… e forçando os Mi-Go a nos atacar pessoalmente, com muito mais ferocidade do que sonhamos possível.

A extinção parecia certa. A máquina de guerra Mi-Go era implacável. O surgimento de ameaças maiores do que a Humanidade, no entanto, mudaram a face da guerra: Hastur, o deus morto, desperta, e conjura um exército de monstros para devastar a Ásia, ameaçando o flanco russo que agora pertence quase exclusivamente aos invasores Mi-Go; a Ordem de Dagon começa a atacar os mares e as costas, buscando despertar seu deus, Cthulhu.

A guerra, antes desesperada, se torna uma batalha pela sobrevivência. Quatro forças aniquilando umas às outras. Este é o cenário atual para os jogadores. O prêmio: sobreviver para lutar mais um dia. A ameaça? Escolha entre loucura, morte… ou a perda de sua própria alma para forças que sequer podem ser compreendidas.

PERSONAGENS

Jogar CthulhuTech envolve, inicialmente, escolher uma raça, entre Humanos e Nazzadi, os descendentes dos invasores que foram inicialmente clonados para nos conquistar. As diferenças básicas são que os Humanos começam mais adaptáveis, e os Nazzadi começam com a habilidade de enxergar no escuro e uma Agilidade ligeiramente maior.

Uma vez escolhida a raça, escolhe-se a profissão, que pode ser montada pelo jogador, ou escolhida entre arquétipos que o livro oferece, incluindo: Agente de Inteligência, Arcanotécnico, Soldado, Tager (pense em um simbionte monstruoso… do lado dos mocinhos), Piloto de Mech (siiiiiim!!!) e piloto de Engel (sintóides tecnorgânicos, como os Evas de Evangelion), entre diversos outros.

Atributos, Perícias, Vantagens e Desvantagens são adquiridos por um sistema simples de pontuação e compra, com um sistema de “cheats” permitindo maior customização. Jogadores também têm um número de Pontos de Drama que podem ser usados para aumentar sua parada de dados em uma rolagem, ou reduzir o número de dados de oponentes… tanto uma ferramenta dramática como estratégica, dependendo do estilo do jogo.

Falando nisso…

ESTILO

Uma das maiores vantagens de CthulhuTech é sua diversidade interna. O livro apresenta contos introdutórios em cada capítulo, e estes variam desde um hack’n’slash estilo Tropas Estelares, a uma rede de intriga digna de Arquivo X.

Um Mestre pode escolher fazer uma campanha de pilotos de Mecha e Engel destinada a enfrentar monstros gigantes inimigos em campo de batalha, com um foco pesado em estratégia militar, combates e táticas diversas, explorando tanto o solo como as profundezas do oceano, e enfrentar mechas aliados traidores, mechas inimigos, ou mesmo criaturas apavorantes.

Outro poderia escolher dedicar seu grupo a combate urbano, protegendo as cidades que sobraram como uma tropa pesadamente armadurada contra ameaças internas.

Um terceiro poderia conduzir seus jogadores por pesquisas arcanas constantemente sob o risco de levá-los a insanidade, investigações internas de contra-inteligência e espionagem para encontrar traidores, espiões ou cultistas infiltrados em virtualmente todos os níveis da sociedade.

A variedade de jogos é interminável, inclusive porque o livro básico oferece um panorama geral bem interessante sobre como é a vida nesses tempos estranhos. Mas uma coisa é certa, por mais que os personagens não saibam, ou se neguem a acreditar: a Humanidade está perdendo. O terror e a desesperança sempre estarão presentes, e o conforto da loucura e do escapismo sempre ao seu lado.

ARTE

O livro em si é simplesmente deslumbrante. Cores vivas, que muitas vezes evocam bem os tons de neon e o exotismo Nazzadi, são usadas também para mostrar o terror da guerra em imagens que lembram o estilo de O Grito. A influência anime pode não agradar a todos, mas ver imagens de Mechas em modo deploy, e monstros avançando por prédios evocam muito bem o tom épico do cenário… enquanto pequenas ilustrações de pessoas no cotidiano com uma sombra disforme ali evoca bem o senso de paranoia.

O SISTEMA

O sistema Framewerk é simples e elegante. Um conjunto de Atributos e Perícias gera uma parada de dados que permite ao jogador lançar um número X de D10’s e comparar seu resultado com uma tabela de sucesso, vendo quão bem sucedido ele é. Para emular os combates de mecha e outros monstros gigantes, o jogo emprega uma diferença de escala: Vitalidade para seres e objetos de tamanho “normal” (como seres humanos, monstros pequenos e veículos pessoais), e Integridade, para coisas grandes (mech, engels, monstros MESMO, prédios…).

A sanidade, claro, não foi esquecida. Conforme os personagens vão enfrentando os horrores do mundo, eles ganham pontos em uma escala de Insanidade, que vai de 0 a 10… sendo que o 7 já é algo plenamente capaz de remover um personagem da campanha.

 

NOTAS (de 1 a 6):
– Layout/Arte:
6 (Decididamente, um dos pontos altos do jogo. Não é para qualquer gosto, mas o uso de cores e sombras é magistral. As ilustrações são lindas ou perturbadoras conforme necessário.)
– Texto: 5 (O texto é bem explicativo, com um índice compreensivo e dinâmico. A linguagem é simples, sem se perder em tecno-baboseiras, e o grande número de siglas mostra bem o quão a Terra se tornou militarizada.)
– Conteúdo: 6 (Novamente, não é para puristas, mas qualquer um que queira encontrar um nicho de pré-apocalipse está em casa com este livro, graças a alta adaptabilidade do cenário.)
Nota Final: 6 (Um jogaço.)

 

Por Rafael Ramos Blanco
Equipe REDE
RPG

 

Site Oficial de CthulhuTech: www.cthulhutech.com/

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