A terceira parte da nossa série de ficções examinando as relações entre os Grandes Clãs com o lançamento da Edição de Marfim se materializando em um futuro próximo!
A Era de Marfim – Parte 3
Por Seth Mason
Editado por Fred Wan
Shinjo Kinto sentou-se à pequena mesa na tenda do comandante que foi armada para ele. A Nona Legião estava acampado apenas meio dia de marcha na Fortaleza no Final da Jornada, descansando para recuperar suas forças. Kinto sabia melhor do que ninguém que era melhor arriscar a possibilidade de ser encontrado por batedores do inimigo do que avançar a noite toda e atacar o inimigo sem descansar antes. De qualquer maneira, era improvável que os samurais enlouquecidos que ocuparam a cidade – “caídos”, como tinham sido chamados – teriam grupos de batedores no campo. Desde que tomaram a fortaleza, houve pouca atividade na região. Eles quase pareciam satisfeitos em manter o controle sobre Final da Jornada e não avançar. Embora interessante, essa informação também significava que o inimigo seria capaz de tirar o máximo proveito da posição defensiva que a fortaleza lhes oferecia.
O comandante da Nona Legião estava movendo despreocupadamente algum tipo de conchas gravadas ao redor da mesa quando Seppun Ryota, seu segundo em comando, se aproximava. “Kinto-sama”, disse o homem em voz baixa, anunciando sua chegada.
“Alguma vez você já jogou este jogo”, perguntou Kinto, sem tirar os olhos de cima das conchas sobre a mesa. “É um passatempo para apostadores, e você não parece ser esse tipo de homem. Mas eu já fui surpreendido antes”.
“Eu estou familiarizado com ele, comandante”, respondeu Ryota, ainda de pé e prestando atenção.
Com um leve sorriso, Kinto ergueu uma pequena moeda entre dois dedos, em seguida, colocou-a debaixo de uma das conchas. Foi então que o Seppun notou que todas as três conchas eram quase idênticas na forma e nos detalhes. Com mãos hábeis, o Unicórnio começou a deslizar as três conchas em torno da mesa de forma vertiginosa. “Eu li o relatório”, disse Kinto enquanto os objetos deslizavam rapidamente fazendo um barulho cada vez que passavam raspando pela mesa. “Uma tropa do Leão está avançando para cá, causando conflito em duas frentes, o que torna impossível gerir efetivamente. O batedor relata que eles são liderados por Akodo Tsudoken e a tropa aparentemente é composta por Leões ligados a P’an Ku”. As conchas pararam e ele olhou para o rosto sério do Ryota. “Eu tenho algumas ideias sobre como podemos fazer o melhor uso dessa informação, mas em primeiro lugar – você sabe em qual das conchas está o koku?”
“Se eu entendi as regras corretamente”, disse Ryota, relacionando a explicação de Kinto sobre o jogo e o conflito,”você deve mostrar qual a concha tem o prêmio, não é?”
Kinto assentiu.
Aproximando-se da mesa, Ryota abaixou sua mão rapidamente, quebrando todas as três conchas. “Seria um dessas, eu acho”, disse ele, olhando para os pedaços depois de levantar sua mão. “Ah”, ele ressaltou apontando para a moeda revelada. “Essa mesmo.”
“Uma interpretação muito vaga das regras”, disse Kinto, sorrindo. “Parece que você tem passado muito tempo perto de mim, meu amigo.”
“Sim, e parece esse tempo gasto com você tem me beneficiado de várias maneiras”, respondeu o Seppun, se esticando para pegar o koku.
“Ainda assim,” disse Kinto, movendo-se para segurar a moeda em cima da mesa com o dedo indicador, “há a questão das conchas quebradas. Você sabe que elas não eram baratas. Eu diria que elas valem… cerca de um koku”.
Ryota olhou Kinto nos olhos por um segundo, e os dois homens abriram um largo sorriso. “Dois truques”, disse o tenente ao compreender. “Você sabia que eu iria abordar o problema dessa forma.”
“Exatamente”, disse Kinto, pegando a moeda e colocando-a sobre o mapa no local indicando a Fortaleza no Final da Jornada. “O koku era o objetivo, mas as conchas eram o problema. Para você, o problema tornou-se o objetivo”. Ele parou por um momento e soltou um suspiro cansado. “Eu tenho algumas instruções para você, aqui, e ordens para os outros. Por favor, certifique-se de que elas cheguem aos oficiais apropriados e estude o que eu coloquei sob sua responsabilidade. E descansar um pouco”.
Ryota assentiu bruscamente, pegando vários papéis enrolados sobre a mesa. “E quanto aos magistrados de Tselu? Conforme sua ordem ontem, eles partiram na nossa frente, embora tenham deixado para trás alguns suprimentos e as tropas que Governador destacou. Será que eles serão capazes de se organizar diante deste novo acontecimento?”
“Tenho fé nos agentes do Campeão de Marfim”, Kinto ressaltou, olhando para longe.
O Seppun olhou seu comandante de modo inquisitivo. “Há algo que você não está me dizendo, Kinto-sama, mas não cabe a mim questioná-lo. Os Magistrados Marfim são notáveis. Se tivéssemos uma legião de homens assim…”
Kinto balançou sua cabeça ligeiramente. “Eles são tão notáveis, Ryota-san”, disse ele, “porque você nunca será capaz de encontrar muitos deles. Agora, não vamos perder mais tempo”.
Ryota fez uma grande reverência formal para o seu comandante, em seguida se virou rapidamente para ir cumprir seu dever.
No silêncio da sua tenda, Kinto riu baixinho para si mesmo por um momento, estendendo a mão para a bagunça deixada sobre a sua mesa. O riso do Unicórnio feneceu e seu sorriso desapareceu lentamente enquanto levantava um pedaço de casca quebrada para contemplá-la.
*****
“Eu não acho que isso seja algum tipo de piada”, disse Ikoma Hakige, pousando sua xicara de chá. O daimyo da família Ikoma era conhecido por ser um pouco imprevisível – uma tempestade de emoção e fúria no campo de batalha um dia, uma pacifico interlocutor na Corte Imperial no outro. Assim, não foi surpresa para ambos os samurais com quem ele tomava chá que seu humor tenha azedado bruscamente.
“De fato não é piada”, disse Doji Shirarou calmamente. Seu sorriso diminuiu um pouco, como se ele estivesse tentando evitar parecer muito alegre em resposta à irritação repentina de Hakige. “A família Doji gostaria muito de apoiar o seu lado.”
“Não há lado nenhum a ser apoiado, Garça”, disse o Leão, cruzando os braços e olhando seriamente o outro homem. “Você está tentando tornar a situação mais complicada do que ela é.”
A companheira da Garça, Asahina Umeko, encolheu um pouco e olhou para sua xícara. “Hakige-sama, você sabe melhor do que nós como o seu clã e o Escorpião estão se dando bem no momento. Afinal, é por meio de seus esforços que a presença do Leão na corte é mantida. No entanto, eu acredito que você está menosprezando a possibilidade do que pode acontecer no futuro.”
“E se eu estiver?” Hakige respondeu com firmeza. “Eu achava que vocês da Garça conseguiam entender uma sugestão sutil de que isso não lhes diz respeito. Claro que o Escorpião está sendo intrometido e irritante. Isso é tudo o que eles sabem fazer. Se eles quiserem levar essa questão adiante – e eu sinceramente espero que eles queiram – então lidaremos com isso quando acontecer. Eu não vejo nenhuma necessidade de interferência da família Doji nesta questão.”
Shirarou levantou uma sobrancelha e observou Hakige cuidadosamente. “Você está… esperando a situação se agravar?”
Foi a vez de Hakige balançar seus ombros de maneira indiferente, sua feições suavizando. “Eu não estou certo de que jogo Bayushi Nitoshi está jogando”, disse ele. “Vários de seus subordinados começaram a interferir em nossas negociações com o Caranguejo. Magistrados imperiais que pareciam ser da família Soshi começaram a inspecionar nossos carregamentos com acuidade extrema, atrasando-os. Eles estão simplesmente tentando nos testar. Com que propósito, eu não posso dizer, mas eu estou contente em fingir que eles não estão fazendo nada.”
“Você sabe que a provável intenção de Nitoshi-sama é conhecer os limites que o Leão determinaram para si mesmos neste tipo de situação,” Umeko se intrometeu. “Ele é um Campeão relativamente jovem, afinal de contas. É possível que ele esteja tentando saber o quão longe ele pode ir sem sofrer retaliação”.
“Cavalheiros”, Hakige começou, inclinando-se para trás, “vocês já tiveram tempo para estudar as táticas de Hida Gojima?”
As duas Garças trocaram olhares vazios e, em seguida, olharam de volta para Hakige. “Temo que eu não esteja familiarizado com o nome”, disse Shirarou.
“Gojima-san foi um pequeno prodígio, uma mente estratégica tão brilhante que até mesmo os meus primos da família Akodo citam sua história regularmente. Ele se parecia com os Caranguejos habituais em suas muitas estratégias baseadas na defensa, mas houve uma batalha onde um conflito na fronteira com a família Daidoji ameaçou se tornar uma guerra declarada entre Garça e Caranguejo.”
Hakige coçou o queixo e tomou um gole de seu chá, estreitando seus olhos como se estivesse pensando em alguma coisa. “Minhas desculpas”, acrescentou depois de terminar sua bebida, “Espero que falar de derrotas passadas de seu clã não seja desconfortável.”
“Então, eu estou entendendo que o Caranguejo saiu vitorioso?” Shirarou perguntou secamente.
“De fato”, respondeu o Leão. “Os Daidoji, esperando pegar os Caranguejos de surpresa, atacaram algumas das terras fronteiriças do Caranguejo. Hida Gojima, o general dos exércitos do clã daquela época, simplesmente recuou. De novo e de novo, ele recuou suas tropas e evacuou seus camponeses. A Garça não conseguia declarar uma vitória verdadeira, buscando enfrentar o Caranguejo e fracassando em cada tentativa.” Hakige olhava para o nada, como se estivesse imaginando. “Era muito tarde para a Garça quando o comandante Daidoji percebeu que estava dentro demais do território do Caranguejo e que a sua chance para retirada – e mesmo sobrevivência – era nula”.
Umeko pigarreou e perguntou: “Então, você deseja esmagar o Escorpião?” A jovem estava claramente incomodada com a ideia.
Hakige fez um gesto de indiferente. “Eu não sou belicista, Asahina-san”, ele disse calmamente. “Se o Escorpião tivesse nos atacado, eu ficaria feliz em matar todos os seus soldados e ver suas construções em chamas. No entanto, eles não nos atacaram. Eles simplesmente nos irritaram… por isso vou esperar. Veja, assim como Bayushi Nitoshi acredita que ele está testando o Leão, nós também estamos testando o Escorpião.”
“O Império já teve uma grande parcela de conflitos como esse,” Umeko falou suavemente. “Eu acho que é mais sábio prevenir um fim violento para isso do que atraí-lo. De qualquer maneira, você pode ficar frustrado, Hakige-sama. Você sabe que a Filha do Céu proibiu a guerra declarada entre os clãs.”
“Guerra?”, falou Hakige, franzindo a testa novamente. “Eu não falei nada sobre começar uma guerra. Na verdade, eu estou certo de que o Escorpião está se aproveitando do fato de tal decreto esteja em vigor. Seria uma pena se eles dessem a Imperatriz, e que ela governe por muito tempo, uma causa para… reconsiderar isso.”
Shirarou e Umeko trocaram olhares novamente.
“Mais chá, meus amigos?”, perguntou Hakige suavemente.
*****
A Nona Legião imperial, porta-estandartes do exército pessoal da Imperatriz, moveu-se adiante a pé e a cavalo. Ao lado do estandarte da Legião, o próprio estandarte pessoal de Shinjo Kinto – confiantemente portando o mon da Casa Shinjo – balançava ao sabor do vento enquanto avançava mais à frente da tropa. Kinto escutou o suficiente para saber que seus parentes tinham enlouquecido, mas esperava que eles continuassem a reconhecer e respeitar os laços de família.
Como esperado, um dos menores portões da muralha externa da Fortaleza no Final da Jornada se abriu, e vários cavaleiros surgiram em um passo acelerado. Eles, também, portavam o estandarte de Shinjo.
Kinto reconheceu o outro Unicórnio, mas com dificuldade. Os olhos de Shinjo Yoshie estavam escuros e transtornados. Seu rosto estava pálido e marcado, como se ela tivesse em um estado de agitação ou excitação por muito tempo sem descanso. “Kinto”, ela chamou, e não era uma saudação amigável. A mulher desembainhou uma longa e impressionante cimitarra enquanto cavalgava.
Ryota e Moto Miyu sacaram as armas e começaram a avançar como resposta. Sem quebrar o contato visual com Yoshie, o comandante fez um gesto de corte no ar, dizendo aos seus homens para ficar onde estavam.
O destacamento de Shinjo Yoshie cavalgava em frente e aqueles que vieram com ela começaram a gritar como loucos. De sua parte, Kinto lutava contra o desejo crescente de desembainhar sua própria katana para seja investir ou retornar à sua legião para começar o ataque. O comandante imperial ficou perfeitamente imóvel em sua sela – Yoshie era uma besta selvagem, e um filho verdadeiro de Shinjo sabia como enfrentar tal criatura.
Quando atingiram a distância para atacar, a espada de Yoshie percorreu em um arco em direção a ele. Kinto moveu a cabeça ligeiramente, como sempre, para o lado, deixando a lâmina da cimitarra passar a milímetros de seu rosto enquanto os gritos e uivos dos Unicórnios enlouquecidos eram dirigidos a ele. A onda recuou enquanto eles viravam sua investida para longe, de volta ao local de onde tinha vindo.
Levemente, de modo que ninguém pudesse ouvi-lo, Kinto soltou sua respiração lenta e nervosamente, mas não se moveu.
“KINTO!”, A mulher chamou novamente, parando sua investida por um momento e se virando para encará-lo. “Sua marionete patética! Venha cá para que eu possa libertá-lo! Dê-me a cabeça daquele que segura a sua coleira”, ela indicou Seppun Ryota “e você poderá voltar para casa. Você poderá ser um de nós, outra vez. Não essa sombra patética de escravidão e obediência”.
“Gostaria de lhes oferecer a chance de se render, lhes poupar. Mas recebemos ordens para executá-los pelos horrores que vocês trouxeram para aqueles que juraram proteger, Yoshie.” Ele fez uma pausa e olhou para baixo por um momento, tomando fôlego. “Eu garantirei que cada um de vocês morra aqui e seja esquecido”, disse Kinto com indiferença.
O tom de sua voz era uniforme. Frio. Ao seu lado, Seppun Ryota pareceu ficar chocado por um instante, mas logo recuperou a compostura.
Yoshie também parecia surpresa com essa afirmação, mas seu rosto se contorceu em uma careta. “Onde está o seu cúmplice, o Campeão Marfim”, ela falou o título de Shinjo Tselu com desprezo indisciplinado. “Sabemos que ele veio com você, servo. Talvez você se ache inteligente e tenha enviando-o para o norte para nos cercar? Você acha que aquela ninharia de soldados vai fazer alguma diferença?” Ela apontou a cimitarra novamente, agora indicando a retaguarda da Legião em direção ao horizonte. “Você é tão incompetente quanto é patético, Kinto. Olhe atrás de você. Isso é como se faz uma ofensiva secundária ameaçadora”.
Desinteressadamente, Kinto virou a cabeça para ver os estandartes do Leão – dominados pelo mon do Akodo – marchando em direção a eles. Muitos deles estavam montados, e seu número quase se igualava ao da Legião imperial. A Nona Legião, entre eles e todas as forças que os Caídos pudessem ter na própria cidade, agora se encontrava irremediavelmente em menor número.
“Vejo que você ouviu falar sobre as atividades do Leão na região”, disse o comandante, voltando-se para olhar para Yoshie. O olhar tranquilo em seu rosto não mudou. “No entanto”, acrescentou , apontando atrás dela com sua mão enluvada, “acho que você não prestou a devida atenção ao exército do Leão. Felizmente, Tselu-san parece ter o encontrado”.
Contra o sol nascente, os soldados marchando e os estandartes começaram a aparecer no horizonte oriental. Vistos contra a luz brilhante do Sol de Jade, era impossível ver as cores ou símbolos das armaduras ou das bandeiras, mas conforme a marcha avançava, o mon do Leão podia ser visto neles, também. Junto com o símbolo da casa Akodo.
E o Campeão do Leão.
E o Khan do Clã Unicórnio.
“A reparação chegou”, disse Kinto. “Lady Shinjo nos ensinou a levar a misericórdia e compaixão para as nossas terras… e a justiça para aqueles que infringem as leis”.
A cabeça de Shinjo Yoshie movia freneticamente para trás e para frente entre a Legião e o exército de Akodo Dairuko ao leste. Com um grito inarticulado, Yoshie balançou sua cimitarra sobre a cabeça e começou a gritar para os Caídos do Leão indicando os recém-chegados.
“A cavalaria do inimigo está se dividindo para interceptar o exército de Lady Dairuko”, Ryota notou rapidamente. “Eles não poderão atacar a cidade com aquela grande tropa flanqueando-os”.
“Isso não vai acontecer”, disse Kinto, colocando seu cavalo em um galope repentino. “Agora, Ryota!” ele gritou para o seu destacamento segui-lo e a Legião Imperial começou a se mover para também entrar em ação – todos se movendo para interceptar a Legião de Caídos de Akodo Tsudoken.
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Tsudoken cavalgava para frente, vendo as bandeiras de seu senhor – não, o filhote mal orientado da linhagem regente dos Akodo, ele se corrigiu. O sangue que liderava o seu clã era tão patético, pensou ele, que um se retiraria e o outro iria para longe de Rokugan, ignorando a segurança do próprio Império.
Ele iria acabar com isso agora. Ele não sabia por que Dairuko estava aqui, mas sua estupidez e sua linhagem fraca e inútil sofreria outro constrangimento neste dia.
Entretanto, algo chamou sua atenção enquanto liderada o ataque, e ele se virou para ver a tropa liderada por Shinjo Kinto. Kinto, o homem que havia atacado a Segunda Cidade, trazendo o caos para a cidade que ele havia jurado proteger.
Não, ele se lembrou. A vingança pessoal iria esperar. Ela teria que esperar, ele tinha que…
A mente de Akodo Tsudoken ficou completamente inerte quando ele viu o que o karo do comandante imperial portava. O estandarte do Governador da Segunda Cidade. O carimbo pessoal de Ikoma Katsuru – o antigo Governador – ainda estava desenhado no centro.
“Em nome do Governador”, Kinto falou, suas palavras esvaecendo, mas claras o suficiente para um Tsudoken paralisado ainda ouvi-las. Tsudoken reconheceu o homem ao lado de Kinto – um shugenja, obviamente levando as palavras do comandante imperial ao vento. “Em nome do homem com quem você falhou, se renda!”
Tal verme ousa estirar a bandeira do venerável Ikoma Katsuru. Para lhe comandar? Ele se atreve?
Ele se atreve?
Raiva, quente e estrondosa, jorrou da boca de Akodo Tsudoken enquanto ele desembainhava sua espada e virava sua investida em direção ao Unicórnio e sua Legião Imperial profana.
Os Leões Caídos, neste momento nada além de um bando desconexo de loucos, não conseguia fazer nada além do que seguir o uivo de seu comandante.
*****
“Eu não estou certa do que o comandante imperial fez”, Akodo Dairuko observou de seu cavalo no terreno elevado conforme seu exército marchava em direção a Fortaleza no Final da Jornada, “mas aparentemente foi mais eficaz.”
Ao lado dela, Shinjo Min-hee, Shinjo Tselu e os conselheiros do Campeão do Leão observaram quando os Leões Caídos de Akodo Tsudoken entraram em um conflito brutal com a Nona Legião.
“Min-hee-san?”, disse Dairuko.
“Sim, Lady Akodo”, Min-hee respondeu, virando-se na sela e levantando um leque de sinalização.
Tselu olhou desconfiadamente para as duas mulheres. “Você está mudando o plano de Kinto-san?”
“A estratégia de Shinjo Kinto é boa, mas sim”, disse Dairuko, sem tirar os olhos da batalha “eu a aprimorei.”
Atrás deles, Min-hee começou a fazer uma série de gestos, de frente para uma elevação a alguns minutos de cavalgada para fora da cidade que bloqueava a visibilidade dos postos de vigia ao redor do Fim da Jornada.
Olhando rapidamente ao redor, o rosto de Tselu se iluminou com a compreensão. “Eu não vejo o seu destacamento principal de cavalaria, Dairuko-sama”, observou ele com um leve sorriso.
“Em breve você verá”, disse ela, devolvendo o olhar confuso a Tselu. “Considero os soldados que eu tenho em seu campo de visão atual mais que suficiente para tomar a cidade. Se o exército de Tsudoken tivesse recuado para a cidade, ele seria uma séria ameaça. Se ele fosse capaz de nos atacar enquanto estivéssemos a pouca distância da cidade, eles também complicariam a batalha”. Dairuko olhou em volta, observando cada detalhe enquanto falava. “O plano de Kinto foi excelente em neutralizar essa força, mas não há necessidade para a Nona de lutar sem auxilio.”
*****
O ar jorrou para fora dos pulmões de Shinjo Kinto quando ele atingiu o chão. Não era a primeira vez que ele tinha sido atirado de sua montaria, mas a ferocidade bruta do impacto foi diferente das outras vezes. Certamente, o que tornou a situação ainda pior foi o peso do homem que tinha causado a queda. Akodo Tsudoken ele investido contra ele e praticamente voou de sua própria montaria, agarrando o comandante Imperial e levando ambos ao chão.
Atordoado e sem fôlego, Kinto quase não discernia que direção era para cima, mas seus pés sabiam. Foi puro instinto que lhe avisou que precisava se manter em movimento para se manter vivo, ele empurrou com um braço e chutou com as duas pernas, tirando o peso de Tsudoken de cima dele bem na hora em que o Leão fez um ataque selvagem com sua wakizashi. Kinto rolou, conseguindo soltar um pé, um joelho e sua mão esquerda enquanto pegava sua própria espada curta.
Entre os dois, a katana quebrada de Tsudoken jazia no chão.
Ao redor dos dois, a Legião imperial lutava contra os Caídos, histéricos animais selvagens que outrora tinham sido samurais.
“Levante-se, criminoso!” Tsudoken gritou, investido com as duas mãos segurando a espada curta.
Kinto esperou até o último minuto, e rolou novamente para longe, mas não foi rápido o suficiente. A arma de Tsudoken errou, mas o Leão se virou e chutou com força as costelas Kinto enquanto ele tentava se manter em movimento.
“Então continue rolando como o cão que você é”, gritou o Leão, socando selvagemente para baixo o crânio de Kinto.
Isso foi demais, Kinto sabia. Sua visão explodiu em pontos brancos de luz, e a falta de ar e de equilíbrio o fez desabar para o lado. Só mais um pouco, ele pensou.
“Isso é tudo?” Tsudoken continuava a gritar, chutando Kinto novamente. O Leão moveu seu pé para cima mais uma vez, e Kinto o agarrou com as duas mãos, uma vez que tinha deixado sua wakizashi cair. Girando o pé, ele fez o Leão perder o seu equilíbrio e espatifar na terra.
Levantando-se rapidamente, Kinto lembrou-se de algo e pisou instantaneamente na coxa direita de Tsudoken, provocando um forte – e vergonhoso – grito de dor de seu oponente. O Unicórnio recuou, sugando o ar da melhor maneira que podia. Para sua surpresa, Tsudoken se levantou rapidamente, ainda gritando de dor, mas aparentemente sem sequelas.
O uivo do leão nem terminou quando ele investiu novamente, segurando sua wakizashi sobre sua cabeça em uma postura grosseira.
Kinto viu a espada descendo, mas suas pernas pareciam estar enterradas na lama. Seus braços se moviam abaixo do cotovelo, mas seus ombros, por algum motivo, pareciam indiferentes aos seus apelos para se moverem.
A lâmina de Tsudoken desceu em um arco rápido e certeiro e empalando-se à esquerda do torso de Kinto. Os gritos de leão se transformaram em uma risada uivante conforme ele pressionava com mais força, quase como se Tsudoken pensasse em enterrar a sua espada e o seu punho no Unicórnio.
Tempo suficiente, Kinto pensou com clareza surpreendente, e ergueu suas mãos para agarrar o pescoço do leão.
Tsudoken pareceu não notar e seu impulso levou os dois para o chão. O joelho do Leão encontrou o estômago de Kinto, e, como resultado, o Unicórnio tossiu sangue sobre o rosto de Tsudoken. O Akodo lambeu o sangue que respingou ao lado de seus lábios e sorriu largamente. “Você morre. Seus homens morrem. Esta cidade é…”
“Não”, Kinto tossiu, e com as últimas forças que lhe restava, puxou o ombro do homem com uma mão e moveu a outra para o lado do queixo de Tsudoken e apertou com toda a sua força.
A última coisa que Tsudoken viu antes de seu pescoço estalar – sua visão foi forçada a virar de volta para a batalha – foi uma linha da cavalaria do Leão e do Unicórnio cair sobre as suas tropas como uma onda, levando-as ao chão.
O Leão caiu morto ao lado de Kinto, e o comandante imperial conseguiu se colocar sobre um dos joelhos. Os sons da batalha pareciam, de alguma forma, muito distantes agora. Conforme os soldados iam entrando e saindo de seu campo de visão, vez após outra, ele pegava vislumbre após vislumbre deles com sua visão escurecendo.
Os estandartes, a cidade.
Os estandartes do Leão, do Unicórnio e do Império de pé e unidos.
Fim da Jornada.
Link para o artigo original:
http://www.l5r.com/2014/02/16/age-ivory-part-3/
Traduzido e adaptado por Rafael Silva