Se você quiser fazer um desenvolvedor de RPG de mesa feliz, chame o jogo deste desenvolvedor de elegante. É o maior elogio que você pode dar a um jogo. É como dizer: “Este jogo é um atleta de classe mundial com doutorado em astrofísica e um senso de estilo impecável.” Elegância significa que o jogo não só funciona, ele funciona bem.
Infelizmente, quando chega a hora de construir um jogo, a elegância é um alvo escorregadio. Não é como cozinhar com sal ou alho, onde se pode simplesmente adicionar mais ou menos a gosto. Elegância é um subproduto da sua abordagem para aquela obra, seu olho para o desenvolvimento e suas decisões sobre quando e como criar regras dentro do jogo. Para tornar as coisas ainda mais complicadas, é mais comum você deixar o jogo mais elegante ao remover algo do que adicionando algo.
Apesar de a elegância ser uma meta complexa, não é absolutamente impossível de alcançar. Minha ferramenta favorita na busca pela elegância é o refinamento (finesse no original). Uma abordagem que tenta colocar um mínimo de esforço, controle e trabalho em um RPG, um desenvolvimento com refinamento baseia-se em alguns preceitos:
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Remova problemas removendo regras sempre que possível.
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Ao se deparar com muitos problemas, resolva-os com poucas grandes mudanças.
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Desenvolva regras invisíveis aos jogadores que não precisam delas.
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Siga com o fluxo do jogo, e não contra ele.
Resolva um Problema Removendo-o
Eu amo essa forma de resolver um problema. É a solução do desenvolvedor experiente mesmo para os pontos mais polêmicos. Se uma parte do jogo não funciona, extirpe-a. Abandone-a! Elimine-a! Os Daleks de Doctor Who seriam ótimos nessa abordagem.
Embora nem sempre seja uma solução prática, a exclusão de uma regra para resolver os problemas que ela causa pode ser uma ferramenta poderosa. Obriga-nos a questionar nossas suposições e nos concentrar nas partes verdadeiramente críticas de um RPG.
No desenvolvimento de D&D Next, fizemos uso desta abordagem desde muito cedo. O processo de controle e cálculo dos testes de resistência em Fortitude, Reflexos e Vontade aumentavam o tempo de criação de personagem e colocava uma camada extra de detalhes em cada monstro. Testes de resistência são, obviamente, importantes para o jogo – mas será que a maneira na qual eles foram implementos anteriormente não adicionava muitos detalhes e complexidade ao jogo?
Pensar nessa complexidade nos obrigou a reconsiderar como estávamos fazendo as coisas – então por que não usar os valores de atributos para fazer testes de resistência? Esta etapa removeu um problema do jogo e acelerou as coisas na mesa. Mantivemos os testes de resistência, mas removemos grande parte da complexidade em torno deles.
Deixar tudo em cima da mesa com potencial para ser excluído força que você desenvolva visando maior eficiência e facilidade. Isso nos lembra de que a complexidade é um investimento que deve ser colocado nas partes do jogo que oferecem as maiores recompensas para Mestres e jogadores.
Compreender esse investimento é fundamental para permitir que você faça os seus cortes nos lugares certos, e demandou grande parte do nosso grande playtest de D&D Next. O entendimento que adquirimos com as pesquisas de Playtest ajudou a guiar as nossas decisões do que cortar, o que diminuir, o que manter e o que expandir.
Uma Bala, Muitos Alvos
Essa máxima requer que você mantenha um pulso firme sobre o conjunto do seu sistema de RPG. Conforme o feedback do playtest chega, é fácil de se concentrar em elementos individuais e ir direto para o trabalho. Alguma coisa está errada e você quer consertá-la. No entanto, é melhor esperar e fazer uma abordagem da imagem completa.
Deixe que todos os feedback cheguem, dê-lhes algum tempo para acumular, e depois comece a trabalhar neles. Para começar, não olhe as especificidades. Categorize os feedback em diferentes temas. Você pode dividi-los por classe, raça, ou subsistemas. Se uma questão está relacionada a várias áreas do jogo, marque-a e classifique-a em cada área.
Muitas questões são simplesmente detalhes que precisam ser aprimorados, ou erros táticos (um feitiço causa muito dano, o ataque especial de um monstro sempre falha contra o teste de resistência) que você pode resolver com uma simples edição. No entanto, quando você vê a imagem completa, você pode ver que o que pareciam ser problemas individuais muitas vezes são diversos problemas menores que se combinam para causar um único problema maior.
Dessa forma, seus grandes problemas – aqueles que exigem mudanças fundamentais no sistema – aparecerão através de múltiplos pontos. Assim, tentar consertar todos esses problemas menores individualmente simplesmente encobrirá o problema verdadeiro e fundamental que está escondido nas profundezas do sistema.
Durante os nossos primeiros testes do D&D Next, a mecânica de Vantagem nasceu a partir dessa necessidade. Em edições anteriores, usávamos pequenas e grandes tabelas para capturar todos os modificadores +1 ou -2 que podiam aparecer no jogo. A Vantagem (junto com sua irmã gêmea sinistra, a Desvantagem) é fácil de lembrar, simples de aplicar antes ou depois de uma jogada, e abrangente o suficiente para acabar com muitas linhas de modificadores complicados.
Passamos por muitas discussões e ideias de como implementar diversas penalidades e bônus no jogo – assim como clamores para simplesmente acabar com todo o conceito ou abordá-lo de uma maneira totalmente diferente. Ao constatar a lentidão que os modificadores ocasionavam, ficou claro que removê-los do jogo eliminariam muitos problemas. O jogo ficou mais rápido, havia menos exceções para memorizar, o Mestre tinha menos coisas para controlar e o jogo se tornou muito mais simples de explicar para iniciantes ou jogadores que não querem memorizar regras muito complexas.
Este caso também mostra como uma regra pode indiretamente levar a outra. Os pontos de ação da 3ª e 4ª Edição inspiraram o conceito de Vantagem. Usar um ponto de ação lhe permite fazer uma ação adicional. Na maioria das vezes, você faz um ataque, erra, e depois gasta um ponto de ação para fazer esse mesmo ataque novamente. Pontos de ação, essencialmente, permitem repetir uma ação em pequena escala, e esse conceito de uma nova jogada como um bônus se transformou na mecânica de Vantagem de D&D Next.
Na 2ª parte deste artigo, Mike continuará com uma discussão sobre ataques de oportunidade, e falará sobre como a simplificação e aplicação de regras do mundo real orienta a busca de refinamento no desenvolvimento do D&D Next.
Link para o artigo original:
http://www.wizards.com/DnD/Article.aspx?x=dnd/4ll/20131125
Traduzido e adaptado por Rafael Silva