Sem toque e sem props de armas!

Live é um jogo. Faz de conta. Teatro. Interpretação.  Não é de verdade e apesar de você estar ‘agindo como se fosse o personagem’ há que se colocar alguns limites, ou a brincadeira pode não acabar bem.

O Mind’s Eye Theatre assim como a maioria dos sistemas de regras para Live (e como já mencionei, mesmo quem joga “sem regras” se baseia em algum sistema de regras já existente ou cria seu próprio!) propõe algumas regras básicas como a ausência de toque e de props de armas. Acredite, são regras importantes.  O quanto elas precisam ser seguidas depende muito do bom senso das pessoas envolvidas, então num primeiro momento, o melhor é segui-las 100% e conforme você conheça seu grupo de jogo (e não haja novas pessoas envolvidas), você poderá adaptar essas regras para o seu estilo de jogo, ainda que em essência, elas precisem sempre estar lá!

Ei, não me toque!

A primeira coisa que é preciso entender é que Live Action é um jogo de interpretação. Ninguém está interessado se você é de fato mais forte ou melhor treinado  que seu adversário, mas se seu personagem o é.  Então por mais que num Live você represente todas as cenas, existem cenas que não podem ser representadas. Uma briga, por exemplo.

Exceto por Batalhas Campais, normalmente os Lives se concentram em situações sociais do cenário de jogo escolhido. Então embora vá acontecer muita intriga, fofoca e outras animosidades, elas não são, normalmente, físicas. Em Lives de Vampire, por exemplo, é costume se determinar que o local é um “Elisium” onde não são permitido aos personagens que portem arma ou se comportem agressivamente. Assim se justifica que personagens inimigos estejam em um mesmo ambiente sem que haja brigas.

Pedro Borges em Live em São Paulo. Vale lançar olhares intimidantes, mas não vale partir pra cima!

Mas nem sempre é possível evitar totalmente as brigas entre personagens. Então voltemos a lembrar: É um Live Action, feito para interpretar e se divertir, e não um simulacro de Clube da Luta para sair de braço quebrado e olho roxo, mesmo que por acidente. Qualquer situação de combate entre dois personagens, se não houver jeito de evitar, deve ser decidida através de interpretação sem toque (que na verdade é uma forma de evitar a briga) ou de regras.

Por interpretação sem toque eu me refiro à postura do personagem: falar alto e grosso, endireitar os ombros para parecer maior e mais forte (ou dobrar os ombros para parecer animalesco)  e dar um passo a frente costuma desconcertar o jogador adversário. Às vezes é o suficiente para ele titubear, e considera-se que você ganhou a disputa através da velha e clássica intimidação.  Lembre-se que num Live, quem pensa e age mais rápido leva vantagem. Se o seu oponente não conseguir reagir rápido o suficiente, mesmo que seja o jogador quem ficou desconcertado, se considera que o personagem também se sentiu intimidado.

Muitas disputas podem ser resolvidas só na interpretação e na linguagem corporal.

Mas se a intimidação não funcionar e os dois personagens estiverem prontos para partir para as vias de fato, é uma das poucas  horas em que o jogo PRECISA ser pausado. Alguns Mestres exigem que essas situações sejam resolvidas com a presença de um narrador. Se for o caso, chame o narrador mais próximo e ele ira instruí-los sobre como agir. Em outros casos, os jogadores são informados das ‘regras de combate’ e tem a liberdade de usá-las. Essas regras variam de sistema para sistema: comparação de fichas, jokenpo (pedra, papel, tesoura!), par ou impar, pequenas fichas que devem ser inutilizadas ao serem usadas, e incontáveis outros recursos: todos eles sem toque.

Uma dica extra pra tornar o Live ainda mais realista mesmo sem toque, é que o perdedor do combate via regras represente a situação em que ficou depois da briga. Se foi uma luta até a morte, bom, “boa noite, foi um prazer jogar com você” e é hora de ir pra casa. Se foi um duelo até o primeiro sangue, alguns recursos interessantes são um pequeno kit de maquiagem para simular um olho roxo, ou manter o braço imóvel o restante do Live simulando um ombro deslocado ou passar o resto do evento mancando, além de ambos, vencedor e perdedor, bagunçarem um pouco suas roupas e seus cabelos… Isso deixa claro para quem não presenciou o combate que algo aconteceu (se fosse verdade, ninguém sai ileso e arrumadinho depois de uma briga, certo?!) e gera plot para você e para os outros jogadores.

Mas não é só para evitar acidentes em brigas que a regra do SEM TOQUE existe. Ela também existe para proteger os jogadores de constrangimentos desnecessários.  Aí entramos em uma questão cultural. Brasileiro é um povo caloroso. Dar mãos, abraçar e tocar em ombro, rosto e cabelos, são coisas que fazemos entre amigos e via de regra, ninguém fica constrangido. Mas em certas culturas essas coisas são até ofensivas.  Por uma questão cultural, Lives brasileiros são mais permissivos com relação ao toque não agressivo, mas é preciso, sempre, usar o bom senso.

Claudinho e Luana: amigos representando um casal.

Live não é hunting ground para paquera (Piada interna: Mas vem cá, isso é On ou é OFF?). Então para sermos permissivos com certo grau de intimidade, é preciso sermos responsáveis também. Se estiver de acordo para os mestres e para AMBOS os jogadores, personagens podem dar as mãos, se abraçar, e usar outros recursos para simular proximidade, mas sempre no limite do socialmente aceitável. E que fique claro que é só um jogo onde personagens podem ter relações que não se equivalem as relações dos jogadores na vida real. Para quebrar o gelo e nos dar uma exata noção de como representar um relacionamento entre certos personagens sem causar constrangimento nos outros jogadores, encontros pré-live (em off, dos jogadores para se conhecerem se já não se conhecem e em on, através de mini-lives e jogos de mesa) são um recurso bastante interessante. Quase como um ensaio antes da peça. Os jogadores podem inclusive trocar idéias abertamente sobre como acreditam ser a melhor forma de criar uma representação verossímil e ainda assim, confortável para ambos.

E se alguém abusar e ficar grudento em um Live, ou mesmo simular agressividade através do toque, não se acanhe em fazer uso da regra: “Ei, é Live. Sem toque!”. Você está totalmente em seu direito de exigir o seu espaço e evitar tanto acidentes como constrangimentos.

 

Sem Props de Armas!

Lembre-se sempre da lei de Murph: se alguma coisa pode dar errado, ela dará! Então essa é uma regra que não pode ser nunca menosprezada: ARMAS DE VERDADE  (qualquer arma de fogo mesmo que descarregada e qualquer instrumento cortante, incluindo adagas, facas e canivetes e o mesmo vale para outras armas… não banque o espertinho!)  SÃO TERMINANTEMENTE PROIBIDAS EM UM SET DE LIVE. SEM EXCEÇÕES, SEM DESCULPAS, SEM JUSTIFICATIVAS.

Armas de fogo, mesmo descarregadas, além de extremamente ofensivas, podem gerar um mal entendido colossal, e o que era pra ser um Live divertido ir terminar a noite numa delegacia de polícia. Mesmo quando o Live acontece num ambiente ‘seguro’ e ‘fechado’, um transeunte passando pela janela ou um vizinho ouvindo a gritaria é o suficiente para causar a maior das confusões. Até explicar pra polícia que focinho de porco não é tomada, o seu Live acaba de descer esgoto abaixo.

O mesmo para instrumentos cortantes, que além de um mal entendido podem causar acidentes que vão variar de desagradáveis à fatais. Não compensa. Não justifica. Não faz nem sentido.  Os Mestres precisam ser categóricos com relação a isso. Gente armada não entra em Live Action e ponto final.  Fim da discussão.

Marcus e seu Brujah bad boy: A arma era de plastico, e ainda assim só foi usada para a sessão de fotografias do clã. Em live? Nem pensar!

Mas e as réplicas?!

Ok, entramos agora em um terreno minado. Ande com atenção e muito cuidado onde pisa. Eu poderia falar aqui: VALE A MESMA COISA. NADA DE RÉPLICAS. Mas a gente sabe que a tentação de caracterizar o melhor possível um personagem é grande demais, que por mais que se tente evitar sempre tem uma prop de arma (FALSA. Repito e reforço: FALSA!) em um Live ou outro e que certos tipos de Live Action, como as Batalhas Campais, exigem o uso de réplicas ou perderiam totalmente o sentido… Então vamos sacar as regras mágicas do bom senso?

  • Armas de Verdade são totalmente proibidas. Isso não está aberto a discussão.
  • Réplicas semelhantes as armas de verdade (por exemplo, pistolas de brinquedo que se parecem com armas de verdade ou réplicas de espadas que não possuam fio mas que sejam feitos do mesmo material que espadas de verdade e tenham o mesmo peso que uma espada de verdade) também devem ser proibidas. Se você tem uma réplica de uma espada medieval ou um revolver de brinquedo que parece de verdade, fica a dica: Se arrume para ir ao Live, peque sua prop, tire muitas fotos, e guarde a prop em casa! Vá para o Live SEM ELA!  Você ainda vai poder compartilhar a incrível verossimilhança da sua caracterização com seus amigos via fotografias, mas vai garantir que nenhuma margem tenha sido dada para o azar!
  • Réplicas claramente réplicas devem ser desaconselhadas, mas, caso permitidas, precisam ficar na vestimenta (bainha, cintura, ou onde quer que o personagem guarde a prop) durante todo o evento, e não devem ser retiradas e usadas para ameaçar outro jogador sob nenhuma hipótese. Se não existirem muitos jogadores presentes e se o local for amplo (já falamos que Murph é soberano?!), pode-se abrir uma excessão para as fotografias ANTES ou DEPOIS do jogo. Durante, volto a repetir, as props não devem ser usadas!  Se houver necessidade de uso em on, vale a mesma regra do SEM TOQUE. A cena é interrompida e decidida via regras, sem usar a prop que está lá meramente como decoração. Mesmo sendo claramente um brinquedo ou uma réplica, sacar uma arma no calor da cena sem total controle da situação pode acabar gerando um acidente (Já levou uma espadada de plástico no rosto? Eu já… Dói demais e deixa roxo!).
  • No caso de Batalhas Campais ou Lives com demonstração de, por exemplo, uma luta marcial, TODAS  as medidas de segurança precisam ser tomadas, isso inclui:

a)      Treinamento prévio de todos os envolvidos, repetidas vezes.

b)      Uso de roupas (de segurança) apropriadas

c)       Uso de tatames ou outros recursos para amortecer a queda

d)      Uso de réplicas apropriadas para a situação (espadas com espuma, armas de treinamento e não as de verdade, etc)

e)      O Live em questão precisa estar acontecendo em ambiente controlado, onde todos os presentes sejam parte do evento ou estejam 100% informados do que está acontecendo (é uma representação, teatro, etc…)

f)       Os presentes mesmo que parte do evento mas não do ‘combate’ simulado, devem ser mantidos à uma distância segura. Se o ambiente for muito pequeno para isso, simplesmente não faça a simulação!

  • A palavra final sobre a possibilidade de réplicas claramente réplicas é do Narrador. Conceder essa permissão inclui a responsabilidade se algo der errado, e a confiança total em seus jogadores de que respeitarão as regras acima.

 

Mas que fique claro: Em ambas as regras, esse nível de permissividade do toque e do porte de props CLARAMENTE FALSAS de armas não vêm de uma hora para outra. E possível de ser feito, mas se você está realizando seu primeiro Live, meu conselho é: SEM TOQUE E SEM PROP DE ARMA, em nenhum grau, de nenhuma espécie, etc. Conheça primeiro como seu grupo se comporta representando sem tocar e sem nenhuma prop indicativa (mesmo que de papelão!) de arma,  e ajuste as regras nos lives seguintes à sua realidade. Mas por mais que você confie integralmente no seu grupo e jogue com eles anos à fio, duas coisas NUNCA  podem ser desespeitadas: A proibição do toque de combate e a proibição do uso de armas de verdade. Se essas regras forem desrespeitadas, toda a essência do Live Action foi também desrespeitada.

Garantida a segurança, vamos falar de justiça? Semana que vem nos encontramos para conhecer a regra de ouro de um Live Action: o Fair Play.

 

Adriana Almeida
Equipe RedeRPG

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Written by Adriana Almeida
Fazendo curso intensivo para vir borboleta na próxima geração. Longa história...
1 Comment
  1. Só pra constar… um pouco antes desse artigo ir pro ar, os meninos estavam lá fora brincando com as espadas de espuma… uma delas estava desencapada e lá me entra meu sobrinho casa adendro sangrando feio no dedo e com um lanho horroroso no braço.Ok que a espada estava desencapada e um tanto do cano de pvc aparecendo, mas durante uma brincadeira “amigável” a espada pode estar boa, quebrar, e o golpe seguinte vir no reflexo. Além do que uma dessas na cara dói mesmo com ela em perfeito estado… Não foi nada sério, mas imagina isso num live, com alguém que não encara esse tipo de acidente tão numa boa, ou sendo um pouco mais sério… Acabou a diversão alí mesmo! :(

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