Física & Magia (I)

A vida no universo (e tudo o mais)

Um dos grandes atrativos dos jogos de RPG é possibilitar que a aventura se desenrole em uma infinidade de cenários, em qualquer tipo de mundo. Porém, há alguns cenários, cujo uso é tão rotineiro, que se tornaram clássicos e a fantasia medieval (envolvendo magos, dragões e criaturas fantásticas) ocupa obrigatoriamente o 1º lugar neste ranking. Claro que existe toda uma infinidade de versões e adaptações deste tipo de cenário, cada uma com seus próprios mundos e reinos, mas a verdade é que ao optar por uma ambientação medieval, poucos mestres se arriscam a desenvolver uma aventura sem incluir em sua narrativa o uso de elementos fantásticos, como a magia.

A magia, aliás, acaba sempre ocupando um ponto de destaque em qualquer aventura de RPG, a partir do momento em que é aceita em seu contexto. Armas mágicas, criaturas mágicas, anéis mágicos (entrem em ação! Desculpem a piada, não resisti…), tapetes, gatos… não importa a forma como se manifeste, os sistemas de jogo mais populares a aceitam e estimulam seu uso, como parte integrante de seu universo de jogo.

Mas o que é um universo de jogo, afinal?

Para responder a essa pergunta,não basta apenas escolher um entre a infinidade de universos, delimitada pelos sistemas de regras, que existem nas mesas de RPG por aí: primeiro é necessário listar ou saber o que existe em um universo de jogo – uma tarefa obviamente complexa, que depende muito do grau de profundidade que o mestre deseja empregar em sua narrativa. Durante a aventura, é a delimitação do universo de jogo (pelo sistema de regras) quem empresta ao grupo de jogadores um sentimento de realidade, delimitando a manifestação criativa de forma aceitável. Mas isso depende também do uso que é feito das regras em jogo e é aqui que se originam as personalidades mais peculiares do RPG, como o advogado de regras, o mestre apelão e os personagens overpower – todos filhotes do que se pode chamar de interpretação burocrática das regras, mas que talvez possa ser melhor definida com o termo imaginação preguiçosa.

Por exemplo, para utilizarmos a magia em uma aventura, sempre nos baseamos nas idéias dos autores do sistema que estamos utilizando. Ou seja, alguém um dia criou um sistema de magia para seu cenário e nós utilizamos o fruto de sua imaginação para construir a nossa, ao invés de reformá-la de acordo com nossas próprias idéias, sem nos preocuparmos com o verdadeiro papel que a magia exerce naquele universo. E é por se basear em conceitos aparentemente abstratos que o uso da magia é fonte de muitas discussões entre jogadores, mas não da maneira como deveria ser discutida: é possível alterar as regras sobre magia de qualquer sistema sem no entanto causar discussões homéricas entre os jogadores, basta apenas delinear o universo de jogo em questão e descobrir exatamente qual o papel da magia dentro dele. O que pode ser feito facilmente com o auxílio da física.

Em nosso universo, a Física trata de uma enormidade de problemas, abrangendo desde a origem e comportamento de partículas subatômicas até o destino final do universo como um todo. As órbitas dos planetas (do primeiro momento de sua origem até os últimos instantes de sua existência), o nascimento de estrelas, as órbitas dos cometas, a chuva de poeira cósmica… tudo está entrelaçado em uma espécie de dança cósmica (alguém aí assistiu a peça de teatro “A dança do Universo”?) perfeitamente sincronizada. Basta dizer que se uma única regra, um único passo errado nesta valsa e a realidade como a conhecemos poderia ser inteiramente diferente, com conseqüências imprevisíveis.

No geral, podemos dizer que uma parte importante do conhecimento físico diz respeito aos constituintes básicos do universo material e suas interações. Nos jogos de RPG, a magia é uma força poderosa e caprichosa, controlada através de procedimentos chamados de operações mágicas. Não há nada em comum entre elas, em um primeiro momento. Mas você é capaz de dizer exatamente o que a magia pode fazer e como ela funciona?

Aptidão Mágica

Podemos dizer que a realidade, como a conhecemos, é uma interpretação dos nossos sentidos. Para quem assistiu aos filmes da série Matrix, essa é uma problematização já bem conhecida. Em tese, é assim que os personagens que interpretamos em jogo também reconhecem sua realidade existencial, através de seus cinco sentidos. Mas há personagens com um sentido extra, que lhes permite aprender e fazer coisas de forma aparentemente inimaginável: a aptidão à magia. Suas ações são, aparentemente, implausíveis, mas explicadas pela inserção no contexto da aventura de um sentido a mais nesses personagens.

Agora, pense um pouco: possuir um sentido extra não faria com que o personagem interpretasse a realidade de forma diferente dos demais, assim como acontece com um deficiente visual ou auditivo?

Perceba que o interesse, aqui, não é o de discutir se magia é ou não possível em nosso universo, mas o de iniciarmos um recorte consciente (do ponto de vista físico) do que pode ser a magia em um universo RPGístico. É importante lembrar que concepções de magia utilizadas em um jogo se baseiam na leitura de livros de regras e no conhecimento que se torna comum à qualquer jogador que os leia. Mas a parte realmente divertida da magia é ler suas entrelinhas e fazer com que o pequeno universo comum a todos os jogadores dê origem a um novo universo, maior e mais abrangente, único e inovador, mas ao mesmo tempo conhecido, tecendo traços em comuns com nosso próprio universo, sem prejudicar o uso da fantasia. Sistemas de regras podem trazer explicações a respeito de como utilizar a magia em nossos jogos, com regras e pré-requisitos. Mas será que devemos realmente nos limitar ao que está escrito ali ou haveria uma maneira de entendermos o papel de um mago no universo de jogo, apenas estudando um pouco sobre nosso próprio universo? É o que vamos tentar descobrir a partir de agora…nos vemos em 15 dias!


Leia os artigos anteriores do autor:

Interlúdio
“Física no RPG ”
“RPG e Física. Alguma relação?”
Por Francisco de Assis Nascimento Júnior

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